Como indicamos na Parte 1, ligada ao conceito do projeto de timonerias de freio, iremos neste post apresentar um exemplo de cálculo para a definição de uma timoneria hipotética mas que irá valer para a definição de toda e qualquer instalação deste tipo no sistema de freio dos vagões. Desta forma, seguiremos os passos indicados, elegendo um vagão do tipo fechado de mesma série do mostrado em nossa Figura 1, abaixo:

Figura 1 – Vagão Fechado Convencional tipo FRS

 

Seguindo então a mesma linha de análise descrita anteriormente, verificamos que este vagão fechado possui uma área útil disponível sob o estrado livre de interferências ou sistemas que venham a complicar o projeto de nossa timoneria de freio. Assim, seguiremos usando o espaço entre truques, sempre lembrando que uma timoneria muda de posição pela movimentação das alavancas e tirantes, devido ao desgaste das sapatas e a consequente atuação do ajustador automático de folgas. Para este e demais passos descritos na sequência, recomendo leitura cuidadosa dos itens mostrados na Parte 1 deste trabalho.

O próximo passo é checar o tipo de truques que será instalado no vagão e qual a definição de suas alavancas, se verticais ou se inclinadas. Consultando nossa ferrovia hipotética, vamos supor que o sistema escolhido como padrão seja o de alavancas inclinadas, o que nos dará duas dimensões de alavancas no truque, o que significa uma dimensão maior para a alavanca viva e outra menor para a alavanca morta, presa ao setor de graduação.

Agora vemos que a complexidade de nossa timoneria não deverá ser grande pois como vimos estamos trabalhando com um vagão fechado em sua área entre truques. Desta forma, vamos iniciar considerando apenas duas (2) alavancas principais, as quais estarão conectadas às alavancas vivas dos truques para dar o necessário prosseguimento à força de frenagem para parar nosso vagão quando de uma aplicação de freio feita pelo maquinista. Lembramos aqui, que para efeito de cálculo de definição, consideramos o valor de 2.280 kgf de força feita pelo cilindro 10″ x 12″, quando de uma aplicação de serviço completa.

Os pesos que serão por nós considerados serão:  Tara de 28.000 kg  e  Peso Bruto Máximo de 100.000 kg.

Estes valores serão usados para sabermos se as taxas de frenagem indicadas em norma serão atendidas pelo sistema de nossa ferrovia, a qual também utiliza sapatas fenólicas com coeficiente de atrito de 0,33, operando em uma região de perfil longitudinal predominantemente plano e com trens mistos de até 120 vagões.

Para nossa instalação, iremos aplicar o ajustador automático de folgas entre as duas alavancas principais, local onde ele poderá oferecer o máximo de rendimento por aplicação. Iremos também definir sua aplicação e de seus complementos como a alavanca de comando e a sua posição inicial de montagem.

Definidos estes parâmetros, vamos então visualizar na Figura 2, o esquema inicial de nossa timoneria:

Figura 2 – Esquema da timoneria de freio

 

Tendo a visão do esquema, podemos iniciar nossa verificação, lembrando que precisamos estabelecer como partida qual seria o valor de taxa de frenagem seguro. Como foi visto na Parte 1 destas notas, as taxas normatizadas estão nas faixas de 15% a 32% da tara do vagão e entre 11% e 14% de seu peso bruto máximo. Desta forma, vamos definir o limite superior da faixa em carregado, ou seja 14% do PBM já que mais à frente nos nossos cálculos teremos que aplicar perdas normais ao sistema, fazendo com que este valor caia.

Tc = 14% = 0,14

0,14 = Fc x 100.000, logo Fc = 14.000 kgf

Esta é a força máxima que nosso sistema fará sobre todas as 8 rodas somadas, para reduzir a velocidade ou parar o trem onde nosso vagão esteja. Vamos checar como ficará a taxa em vazio considerando o máximo de frenagem

Tv = 14.000 / 28.000

Tv = 0,500 = 50% da tara

Este valor não pode ser aplicado pois ultrapassará muito o limite superior de norma que é 32%. Isto nos obrigará a usar no conjunto pneumático um dispositivo vazio-carregado, com 50% de variação, ou seja,

Fv = 14.000 x 0,5 = 7.000 kgt

Tv = 7.000 / 28.000

Tv = 0,25 = 25% da tara. Este valor atenderá nossa necessidade, nos deixando no meio da faixa em vazio.

Resumindo, teremos como base:

Taxa em carregado: Tc = 14% do PBM

Taxa em vazio: Tv = 25% da tara do vagão

Força em carregado: Fc = 14.000 kgf

Força em vazio: Fv = 7.000 kgf

Dispositivo vazio-carregado de variação 50%

Importante: Lembro que estamos usando o “car-set” padrão de freio pneumático composto de cilindro 10″ x 12″, reservatório serviço auxiliar de 41 x 57 litros e válvula tipo ABDX.

Vamos agora definir e calcular a furação das alavancas principais do sistema, que são aquelas ligadas ao cilindro de freio, sua alavanca oposta e a alavanca de comando do ajustador, passando pela análise do sistema de freio manual usado nas operações de estacionamento dos vagões nos pátios.

Como já citamos, o cálculo do sistema de alavancas é bem simples e deve ser iniciado pela força F0, que é aquela feita pelo cilindro de freio para uma aplicação de parada do trem. Vamos então definir as forças que passam pelos tirantes de freio e que puxam as alavancas nos seus pontos de conexão, multiplicando a força inicial em função da furação existente.

Assim,

F0 x (A + B) = F1 x B …. F1 = F0 x (A + B) / B

F1 x A = F2 x (A + B) …. F2 = F1 x A / (A + B) …. F2 = F0 x A / B

F2 x (390 + 195) = F3 x 195 …. F3 = F2 x (390 + 195) / 195 …. F3 = F2 x 585 / 195… F3 = F2 x 3

F3 x 280 = F4 x (140 + 280) …. F4 = F3 x 280 / 420 …. F4 = F3 x 3 x 0,66 …. F4 = F3 x 2

Vamos sempre lembrar que o valor de F4 é o total calculado que chegará a 1 dos triângulos de freio.

Para obtermos a força total será necessário fazer F4 x 4 triângulos. Este valor será o total de força bruta de frenagem.

Colocando então nossa equação de forma sequencial, teremos que Ft será

Ft = F0 x A / B x 3 x 2 x 4 triângulos 

Esta é a força total derivada dos cálculos acima, onde ainda temos a indefinição dos valores de A e B, na furação a ser aplicada às alavancas principais. Para descobrirmos os valores de A e B, precisamos seguir um pouco mais à frente em nossos cálculos, encontrando o valor a ser usado como força inicial feita pelo cilindro de freio (F0). vamos, então calcular F0.

Como o cilindro é o ponto de partida da movimentação das alavancas, ele exerce uma força que é provocada pela pressão de equalização quando o maquinista efetua a redução de aplicação e a pressão se estabiliza em 64 psi (0,045 kgf/mm²). Esta pressão aplicada sobre a superfície interna do cilindro, onde se encontra montado um copo de borracha, empurra o êmbolo interno do cilindro para frente, estando este ligado a uma haste metálica presa à alavanca principal do sistema.

Vamos então calcular esta força provocada pela pressão interna no cilindro

P = F / A  como

A = ¶ x d² / 4  então, como o cilindro tem 10″ (254mm) de diâmetro, teremos  A = ¶ x (254)² / 4

A = 3,1415 x (254)² / 4  nos dá  A =  50.670,74 mm² (área interna do cilindro onde o ar comprimido atua)

Para conhecermos a força feita pelo cilindro, aplicamos na fórmula geral e encontramos

P = F / A …. F = 0,045 x 50.670,74 …. F = 2.280 kgf

Este é o valor de força máxima realizado pelo cilindro quando de uma aplicação de serviço total e a usaremos na continuidade do nosso estudo.

Vamos agora continuar buscando os valores de furação A e B das alavancas, transferindo o valor de força no cilindro para a equação abaixo

Ft = F0 x A / B x 3 x 2 x 4 triângulos

Ft = 2.280 x A / B x 3 x 2 x 4 triângulos

Ft = A / B x 54.720 …. 14.000 = A / B x 54.720 …. A / B = 0,256

Sabendo então que o comprimento total das alavancas foi definido como 900mm em função da área disponível sob o estrado do vagão, podemos montar nosso sistema e achar os valores da furação.

A + B = 900

A / B = 0,256 …. desta forma, substituindo encontraremos

A = 0,256 B …. 0,256 B + B = 900 …. 1,256B = 900 ….B = 900 / 1,256 …. B = 716mm

Como A + B = 900 e B = 716, o valor de A será a diferença, ou seja,

A  + B = 900 …. A + 716 = 900 …. A = 184mm

Nota Importante: Estes são os valores calculados em função das bases que estabelecemos no início do nosso trabalho. No projeto definitivo, precisaremos manter o ajustador sempre alinhado para que ele não sofra desgastes em suas partes internas e com isso perca a efetividade.

Agora, considerando uma perda de cerca de 30% no sistema, em função das folgas existentes nas conexões, teremos uma ideia mais próxima do que realmente ocorrerá. Vamos então incluir esta perda e ver o que irá acontecer com os valores que acabamos de calcular.

Ft = F0 x R x µ    onde

F0 é a já conhecida força feita pelo cilindro, R é a multiplicação proveniente das alavancas do estrado e truque, e µ é o rendimento afetado pela perda de 30%, ou seja, consideraremos uma efetividade de 70%.

Então, teremos

Ft = 2.280 x 184 / 716 x 24 x 0,7

Ft = 9.843,48 kgf

Com esta força mais baixa em função das perdas, teremos as seguintes taxas de frenagem,

Tc = 9.843,48 / 100.000 …. Tc = 0,0984 …. Tc = 9,48% < 11% (valor mínimo da faixa em carregado)

Vejam que considerando a perda de 30% no sistema, o valor total da força de frenagem cairá e com isso teremos um valor de taxa de frenagem abaixo do mínimo da norma. Isso por norma não poderá ser aplicado!

O QUE FAZER ENTÃO??

Como não sabemos se na prática os 30% de perda serão confirmados, vamos modificar o valor de furação das alavancas para compensar parte deste efeito. Vamos aumentar o valor da furação intermediária da alavanca principal de 184mm para 210mm, e acompanhar o que ocorrerá com os cálculos.

Aumentando o valor da furação para 210mm, o outro valor será reduzido pois o comprimento total da alavanca de 900mm não será alterado.

Então, 900 – 210 = 690mm, que será o outro novo valor de furação.

Colocando estes valores nos cálculos, encontraremos

Ft = 2.280 x 210 / 690 x 24 x 0,7

Ft = 11.657,74 kgf

Este novo valor de força total corrigido, nos colocará novamente dentro da faixa de taxa de frenagem em carregado, que é a nossa preocupação em termos de segurança operacional.

Tc = 11.657, 74 / 100.000 … Tc = 0,1165 …. Tc = 11,65% do PBM ….OK

Checando a nova taxa em vazio com a aplicação do vazio-carregado de 50%, teremos

Fv = 11.657,74 x 0,50 …. Fv = 5.828,87 kgf

Tv = 5.828, 87 / 28.000 …. Tv = 0,2081 …. Tv = 20,81% da tara ….OK

Mas, antes de continuarmos, ficam aqui perguntas importantes: Não precisamos checar o que ocorre quando o vagão estiver parado em um pátio e o freio manual for aplicado? Não existe um valor de taxa de frenagem para o freio manual? A resposta é SIM para ambas!!!

Precisamos checar também o freio manual de acordo com sua configuração mostrada no esquema geral da timoneria da Figura 2.

Como a condição mais desfavorável para um vagão parado em um pátio é não deixar que ele se movimente quando estiver carregado, a norma pede que se considere apenas esta condição para um valor mínimo de 10% do PBM. Assim, a força que o freio manual executa sobre as alavancas, precisa chegar às rodas com um esforço que atenda a esta condição. Vamos fazer isso!!

Na Figura 3, segregamos a parte da timoneria do freio manual e sua conexão com o sistema de alavancas que foi objeto do nosso cálculo anterior.

Figura 3 – Timoneria do freio manual

Vamos estudar como a aplicação de força é executada para segurar o vagão no pátio, começando pela caixa de freio manual. Ela possui um volante metálico de 560mm de diâmetro e dentro dela é montado um jogo de engrenagens que visa aumentar a força que um homem normal executa. Pelos valores medidos ao longo do tempo e tendo em vista que a força aplicada pode variar conforme a condição física do operador, ficou definida para efeito de cálculo uma força média de 56 kgf sendo esta força aplicada no aro do volante do freio manual.

Como dissemos, a relação de engrenagens internas da caixa provoca uma multiplicação sendo o valor da relação para a classe de aparelhos padronizada pelas ferrovias brasileiras estabelecido para os fabricantes em 5,36, ou seja, o valor da força aplicada ao lolante já é aumentado em mais de 5 vezes sómente pelas engrenagens internas.

Seguindo a linha partindo da caixa, chegamos ao excêntrico, também conhecido em algumas ferrovias como balancim ou bell crank (USA). Esta peça fundida não é obrigatória nas instalações de freio manual mas algumas vezes recomenda-se sua aplicação quando se precisa incrementar ainda mais o valor da força de frenagem de estacionamento. O excêntrico de freio por sua forma e relação de furação aumenta em mais 32% a força gerada pelo operador e amplificada pelas engrenagens internas.

Como informações necessárias para se fechar o valor da força Fm feita pelo tirante que vem da caixa e passa pelo escêntrico, lembramos aqui que ela é afetada diretamente pela perda devida ao enrolamento da corrente dentro da caixa, o que nos tira produtividade. Este valor do enrolamento máximo definido em norma é de 44,45mm.

Vamos agora escrever a equação de definição de força Fm, necessária a manter um vagão carregado totalmente imóvel mesmo estando carregado no seu limite máximo,

Fm = 56 x 280 (raio do volante) x r x C / D    onde

Raio do volante = 280mm

Engrenagens  r = 5,36

Excêntrico  C = 1,32

Enrolamento  D = 44,45

Fm = 56 x 280 x 5,36 x 1,32 / 44,45

Fm = 2.495,8 kgf  

Obs: Note-se que esta força é ligeiramente superior aquela proveniente da pressão de equalização no cilindro de freio.

Aplicando-se agora a força Fm no sistema de alavancas do estrado e dos truques, já que o tirante que vem do excêntrico também está conectado com a alavanca principal do cilindro, encontraremos a força provocada pelo freio manual nas 8 sapatas

Fm = 2.495 x (210 / 690) x 24 x 0,7

Fm = 12.757,04 kgf

Isto nos dará uma taxa de frenagem em manual de

Tm = 12757 / 100.000 …. Tm = 12,75% do PBM …. OK

Concluímos então que até este ponto nossa timoneria de freio está atendendo a todos os pontos da norma. Resumimos abaixo os três valores de taxa de frenagem calculados

Vagão carregado: Tc = 11,65%  (11% a 14% do PBM)

Vagão vazio: Tv = 20,81% (15% a 32% da tara)

Freio manual: Tm = 12,75%  (>10% do PBM)

Atendidos os valores de taxa de frenagem, precisamos agora definir o projeto da alavanca de comando para que o ajustador de folga trabalhe adequadamente, mantendo o curso do cilindro de freio e a distância entre sapatas e rodas.

Este caminho é necessário para que possamos partir para a Parte 3 das nossas notas sobre projeto de timonerias de freio, a qual será dedicada ao dimensionamento dos componentes como alavancas, tirantes, pinos, etc.

Vamos então iniciar, analisando a Figura 4, indicativa da montagem do ajustador de folgas e sua alavanca de comando. Esta figura mostra a montagem em corte frontal para facilitar nosso trabalho de definição dimensional.

Figura 4 – Esquema da alavanca de comando do ajustador

Para que o ajustador tenha efetividade de trabalho, teremos obrigatoriamente que seguir a relação de proporcionalidade 210 / 690 = C / D. Isto siginifica que a alavanca comandará o giro do corpo do ajustador sob a mesma proporção de furação existente na alavanca principal do sistema. Sem esta proporcionalidade, o ajustador trabalhará fora de sintonia com o desgaste das sapatas, demorando ou acelerando o giro do corpo do ajustador, desbalanceando o movimento de aproximação das sapatas nas rodas e alterando o valor do curso do cilindro para valores maiores ou menores, causando perda ou excesso de força disponível quando uma redução de aplicação de freio for realizada. Em resumo, um grande problema!!

Montando então a relação, podemos ter

210 / 690 = C / D …. como D = 690 – 63 (dist. centro da biela do ajustador) = 627mm

210 / 690 = C / 627 …. logo C = 210 x 627 = C x 690 …. C = 190,8mm = 191mm

Nesta condição teremos então: 210 / 690 = 191 / 627 = 0,304      Plenamente satisfatória!

Lembretes importantes:

A- O valor da cota C define a distância da biela de acionamento do ajustador até o suporte de encaixe que recebe a extremidade da alavanca de comando. Este suporte é conhecido como “cadeirinha” em função de sua forma;

B- A cota E é a distância que deve ser deixada na extremidade da alavanca de comando para que ela não saia da abertura da cadeirinha. O valor mínimo de norma desta cota E deve ser de 76mm (3″) e caso haja a necessidade desta ser menor que este valor normatizado, recomenda-se a aplicação de um pino de retenção.

C- A cota F é a distância da extremidade da alavanca de comando até a linha de centro do cilindro de freio. O valor mínimo para que não ocorra choque do êmbolo interno do cilindro quando de uma aplicação com a ponta da alavanca de comando é de 38mm (1.1/2″).

Checando a alavanca de comando após conhecidos os valores mínimos das cotas E e F, encontraremos

627 + 191 + E + F = 900

627 + 191 + 76 + F = 900 …. estamos inicialmente mantendo aqui os 76mm de extremidade recomendados pela norma para ver o que ocorre com o valor da cota F que precisa ser de 38mm no mínimo.

894 = F = 900 …. F = 6mm …. valor menor que 38mm e portanto não aceitável, nos obrigando a reduzir o comprimento da extremidade da alavanca de comando e instalando um pino de retenção.

Assim, vamos calcular este valor partindo agora do valor mínimo de 38mm da distância entre a ponta da alavanca de comando e a linha de centro do cilindro para ver quanto sobra de extremidade da alavanca de comando,

627 + 191 + E + 38 = 900

E + 856 = 900 ….  E = 44mm < 76mm …. teremos que instalar um pino na ponta da alavanca de comando para que ela não desencaixe da abertura na cadeirinha, devido às vibrações que atingem os vagões em serviço.

Temos agora condições de fechar o esquema geral da timoneria de freio do nosso vagão fechado hipotético e resumí-lo na Figura 5, a seguir:

Figura 5 – Esquema dimensional final da timoneria

 

Agora, como conclusão desta Parte 2 sobre o projeto de timonerias de freio, nos falta verificar a condiição de parada do vagão fechado, sempre com suas rodas girando para evitarmos travamento, o qual poderá ocasionar um calo na superfície de rolamento das rodas, o que será extremamente danoso para o sistema pelos impactos provenientes na via, a cada giro das rodas.

Na Figura 6, abaixo, vemos a condição para que as rodas parem girando quando de uma aplicação

Figura 6 – Condição de frenagem sem travamento

A correta condição de frenagem sem travamento das rodas ocorre quando a força de frenagem F é menor que a força P, representativa do peso do vagão. Como estamos estudando o efeito por roda, vamos calcular 1/8 do que acontece quando o freio a ar for aplicado, levando em consideração o peso do vagão VAZIO, que é a pior situação operacional que favorece o travamento.

As forças indicadas como F’ e P’ são as normais ao sistema e variam com os respectivos coeficientes de atrito entre os materiais. A força F’ varia com o coeficiente sapata x roda e a força P’ com o coeficiente roda x trilho.

F = 1/8 x 5.828 (força de frenagem em vazio) …. F = 728,5 kgf

A componente F’ derivada desta força será

F’ = 728,5 x 0,33 (coef. sapata x roda) …. F’ = 240,4 kgf / roda

Agora, vejamos como calcular o peso P’, seguindo a mesma metodologia de raciocínio

P = 1/8 x 28.000 ….P = 3500 kgf

A componente P’ então será obtida

P’ = 3.500 x 0,10 (coef. roda x trilho) …. P’ = 350 kgf / roda

Vemos que a condição para que não ocorra o travamento foi plenamente atendida, ou seja,

F’ < P’ …. 240 kgf < 350 kgf      As rodas não irão travar durante as aplicações de freio

Com esta verificação fechamos este estudo, deixando agora como Parte 3 do projeto de timonerias, a etapa que trata do dimensionamento das peças do sistema como alavancas, tirantes, pinos, garfos, etc.

Até breve!!

1- ASPECTOS GERAIS

Poderíamos dizer que desde o início efetivo das operações ferroviárias, um dos aspectos que mudaram radicalmente a Engenharia Ferroviária foi a introdução do freio a ar comprimido, devida à genialidade de George Westinghouse no início do século XX. Antes dele, a própria ferrovia foi posta em cheque em função dos constantes acidentes que ocorriam com elevado número de vítimas. Os jornais norte-americanos da época chegaram mesmo a pedir a paralização total das operações pela precariedade do sistema de freio aplicado ao material rodante.

Já comentamos aqui o funcionamento do sistema pneumático criado por Westinghouse no post relativo à evolução das válvulas de freio e por isso mesmo, iremos desta vez focar nossos esforços no sentido de esclarecer muitas dúvidas existentes quanto à parte mecânica do conjunto, ou seja, a definição técnica para peças como alavancas, tirantes, etc, as quais compôem a chamada TIMONERIA DE FREIO. Ela sempre existiu nos vagões pois permite a efetividade da aplicação da força de frenagem sobre as rodas, podendo ampliar ou diminuir a força que é feita pelo cilindro de freio quando o êmbolo interno é empurrado para fora, começando a frenagem  Ver Figura 1, abaixo.

Figura 1 – Timoneria de freio esquemática para vagões

Neste trabalho, procuraremos mostrar como devemos iniciar o projeto de uma destas instalações mecânicas em função do vagão onde ela será montada, de forma a fazer com que a mesma funcione dentro de determinados parâmetros de eficiência e segurança estabelecidos nas normas e práticas de operação ferroviária.

2- PONTOS BÁSICOS

Alguns pontos básicos precisam ser seguidos para que uma timoneria de freio seja realmente eficiente e segura:

2.1 – Área disponível

O tipo de vagão para o qual estivermos projetando a nossa timoneria de freio, irá determinar a área efetiva de trabalho que poderemos vir a utilizar. Todos sabemos que a timoneria é uma continuação da parte pneumática do sistema pela ligação direta entre o cilindro de freio e a alavanca principal a ele conectada. Como a força realizada no cilindro para uma aplicação de serviço é definida em função da pressão de equalização e que tal pressão tem valor especificado em norma como sendo 64 psi (4,5 kgf/cm2), teremos uma força disponível aplicada no tôpo da alavanca principal de 2.280 kgf para um cilindro de 10″ de diâmetro por 12″ de comprimento. Daí para frente, o trabalho será feito pela timoneria que amplificará esta força até que as 8 sapatas toquem as rodas promovendo a frenagem sem travamento, arrastamento ou excesso de temperatura. Este é o princípio da eficiência de frenagem!! Quando viermos a abordar o exemplo de um cálculo completo, poderemos esclarecer mais estes valores.,

Tendo tal princípio claro, precisamos estudar com bastante cuidado a área disponível para a instalação da timoneria, a qual pode estar montada na parte inferior ou na parte inferior e também na parte superior do estrado como no caso de vagões hopper. Tudo irá depender da geometria da estrutura resistente do vagão, lembrando que a timoneria muda de posição com o tempo em função do desgaste das sapatas de freio. Como informação inicial, destacamos que os vagões do tipo gôndola e fechado são os mais favoráveis para a definição da timoneria, sendo que no caso dos hoppers teremos mais dificuldade em função das tremonhas de descarga, nos plataformas as vigas com inércia variável e nos tanques as restrições para soldagem de suportes no corpo cílindrico, além do espaço consumido pela tubulação de descarga.

2.2 – Padrão de truques

Outra etapa importante do nosso caminho é conhecer o padrão de truques usado na ferrovia onde o vagão irá circular. Alguns poderão perguntar: Por que os truques afetarão o projeto da timoneria de freio? A resposta está ligada ao sistema de alavancas que é usado pela ferrovia, ou seja, saber se são usadas alavancas verticais ou inclinadas. Enquanto que as primeiras recebem o tirante principal de ligação do truque com a timoneria da caixa, na linha de centro do vagão, o sistema com alavancas inclinadas recebe o tirante lateralmente à linha de centro do vagão. Na Figura 2 a seguir, podemos ver a diferença mencionada e concluir que nossa escolha estará diretamente ligada a manter a padronização e principalmente a intercambiablidade dos truques.

 

 

Figura 2 – Diferenças de truques com alavancas verticais ou inclinadas

 

Estas configurações fazem parte do sistema total de freio do vagão, ou seja, a multiplicação realizada nas alavancas que estão no estrado (F), são complementadas pela multiplicação que é feita em cada truque. Portanto, a relação de  multiplicação total proporcionada pela timoneria é a soma das timonerias do estrado e dos truques. Mais a diante, quando formos exemplificar o cálculo da timoneria total, estaremos detalhando como cada parte trabalha para atingirmos a eficiência necessária que será refletida nas taxas de frenagem. Na Figura 3, encontramos o esquema de cada opção de montagem citada para os truques e a furação padrão para cada montage

Figura 3 – Esquema de furação das alavancas dos truques

 

Na primeira versão ambas as alavancas possuem uma furação de 127mm x 254mm, que é a mais comum na bitola métrica e a segunda versão mostra a aplicação de dois tipos de alavanca, sendo a maior, também chamada de alavanca viva (alavanca que é conectada ao tirante que vem do estrado) com furação de 195mm x 390mm com a menor conhecida como alavanca morta (alavanca presa ao setor de graduação) com furação de 140mm x 280mm, muito utilizada na bitola de 1,60m. Todas estas dimensões serão devidamente mencionadas quando de nossa análise completa e cálculo demonstrativo.

2.3 – Complexidade

Conhecida a área disponível no vagão, destinada à timoneria de freio, bem como o sistema de alavancas que está padronizado para os truques, precisamos ter em mente que o projeto da timoneria precisa ser o mais simples possivel em termos de quantidade de componentes. Muitas alavancas implicam em mais suportes, pontos fixos, corrediças, etc., o que além de encarecer a solução a adotar, também afetará o rendimento do freio. Quando realizamos o cálculo das peças da timoneria, verificamos o quanto a força feita no cilindro de freio é amplificada. Porém, a complexidade da solução pode nos tirar a eficiência necessária pois todos os pontos onde haja atrito e conexão entre pinos e furos, irão reduzir a força efetiva.

Muitas vezer temos dificuldade de projetar uma timoneria de freio simples, composta de apenas duas alavancas, como já citamos acima. Por isso, o projetista precisa ter o máximo de cuidado para prever um sistema com um mínimo de perdas. A Associação Americana de Freio a Ar (Air Brake Association) nos recomenda que não apliquemas soluções que possam retirar mais do que 30% de efetividade do sistema de alavancas e tirantes, o que é o mesmo que dizer que deve ser considerado como mínimo um rendimento de 70%. Assim, quando realizarmos os cálculos demonstrativos na Parte 2 deste trabalho, aplicaremos um fator de perdas que nos garanta a segurança e a eficiência necessárias para que o trem possa parar dentro dos limites estabelecidos.

Em resumo a mensagem que fica é: busque utilizar a menor quantidade de alavancas possível!! Isto te trará muitos benefícios com menos perdas!!

2.4 – Pesos

Para definir uma boa instalação de freio, precisamos saber o total de massa a ser freiado. O trem pode ser composto de vagões com vários tipos, tamanhos e pesos e tudo isso precisa ser devidamente equilibrado para que não ocorram choques. Lembremos que os sistemas de freio dos vagões, apesar de serem desenvolvidos de forma individual, deverão trabalhar de forma conjunta e equilibrada quando o trem estiver montado. Conhecer claramente os valores de tara e de peso bruto máximo de cada veículo é indispensável para aplicarmos os valores no cálculo das taxas de frenagem em vazio e em carregado (parte 2), as quais são estabelecidas em norma como controle para uma segura distância de parada. Além disso, é conhecendo os pesos que o projetista poderá definir se a instalação da timoneria de freio terá, ou não, um dispositivo chamado de vazio-carregado, o qual graduará a pressão de ar que chegará ao cilindro, graduando em consequência a respectiva força a ser amplificada na timoneria e aplicada às rodas.

Para auxiliar no conhecimento dos valores de peso bruto máximo que devem ser considerados, recomendo a consulta e a leitura do nosso post sobre Classificação de vagões no Brasil. Lá estão os limites de quanto os vagões pesam carregados em função de sua capacidade e de seus componentes básicos como estrurtura, truques, rodas, eixos, rolamentos, etc. Para a tara, existe uma análise que deve estar diretamente ligada ao bom senso, ou seja, sabemos que um vagão plataforma pesará vazio muito menos que um graneleiro, logicamente devido à sua definição estrutural. Além disso, como existe uma pressão das ferrovias para que os vagões sempre pesem o mínimo possivel, especial cuidado deve ser dado pelo projetista para que ele não instabilize o trem durante uma aplicação de freio, seja ela normal, para controlar a velocidade ou para parar o trem, seja ela em aplicação de emergência, a qual incrementa mais força sobre as rodas, exatamente para que a distância de parada seja menor.

2.5- Taxas de Frenagem

Chegamos agora a uma importante definição que devemos dar ao nosso projeto de timoneria: saber como nosso vagão está em relação aos valores de taxa de frenagem estabelecidos nas normas. Como já citamos por várias vezes, cada vagão tem suas taxas de frenagem em vazio e em carregado e tais taxas são definidas como sendo o total de força aplicado sobre as rodas estando o vagão vazio (Fv) ou vagão carregado (Fc). No cálculo da timoneria, como veremos, dividindo este total de força por sua tara, teremos a taxa em vazio e dividindo pelo peso bruto máximo, a taxa em carregado.

Taxa de frenagem em VAZIO:                  Tv (%) = Fv / TARA

Taxa de frenagem em CARREGADO:     Tc (%) = Fc / Peso Bruto Máximo

As taxas de frenagem são expressas em termos de porcentagem e os limites hoje considerados para os vagões pelas normas são:

Faixa de taxa de frenagem em vazio: de 15% a 32% do valor da tara do vagão.  Assim, poderemos usar de 15 a 32% do valor da tara para freiar o vagão vazio.

Faixa de taxa de frenagem em carregado: de 11% a 14% do valor do peso bruto máximo. Assim, poderemos usar de 11 a 14% do valor do PBM para freiar o vagão carregado.

Se o valor de força sobre as 8 rodas estiver contido nestas faixas de taxa de frenagem, haverá segurança suficiente para que não ocorram choques perigosos à segurança operacional dos trens. Caso estejam fora destes valores componentes importantes como engates, mandíbulas, aparelhos de choque, etc ficarão vulneráveis a quebras e separação indevida no trem.

Quando do cálculo de demonstração que faremos na Parte 2 deste trabalho, poderemos verificar com valores reais de taxa de frenagem como devemos seguir definindo nosso projeto sem receios. Hoje, existe um padrão operacional das ferrovias onde TODOS os vagões indistintamente devem seguir às faixas de taxa de frenagem.

2.6- Sapatas de freio

As sapatas de freio são os elementos que tocam as superfícies das rodas quando da aplicação de freio. É portanto por meio do atrito que o trem reduz sua velocidade ou é parado dentro de algum limite de pátio ou via de cruzamento.Antigamente as sapatas de freio eram produzidas de ferro fundido, já que este material fornecia suficiente coeficiente de atrito com as rodas para equilibrar a ação de frenagem dos trens. Como o aumento de peso, comprimento e velocidade dos trens que possuímos, foi desenvolvida uma resina fenólica oara a fabricação das sapatas. Enquanto que as sapatas de ferro fundido possuem um coeficiente de atrito com as rodas em torno de 0,15 as sapatas fenólicas possuem o dobro, ou seja 0,33.

Estes valores são muito importantes no processo pois apesar das sapatas fenólicas serem muito mais eficientes em termos de frenagem, distância de parada, etc,, elas acabam por concentrar muito calor nas pistas de rolamento das rodas, o que pode ser perigoso para o aparecimento de trincas que poderão quebrar as rodas ou movê-las nos eixos, gerando perda de bitola de eixamento com consequente descarrilamento. Desta forma, sempre que calculamos a timoneria de freio, ao final dos cálculos, checamos se a carga térmica está demasiada.

Igualmente importante trata-se da verificação de demanda de frenagem, a qual também varia com o coeficiente de atrito sapata x roda. O princípio do bom sistema de freio nos pede para definir uma instalação onde todos os veículos do trem parem sempre com as rodas girando, mesmo em situações de emergência. Caso haja excesso de frenagem e travamento das rodas, poderemos ter a ocorrência do CALO, exatamente gerado pela perda da condição de girar das rodas durante as aplicações de freio. Neste caso de demanda, comparamos 1/8 da carga vertical que chega às rodas em função do peso do vagão vazio ou carregado, com 1/8 da força de atrito normal à superfície da pista de rolamento da roda. Obrigatoriamente,a componente de atrito não poderá ser maior que a componente calculada na carga vertical pois caso assim ocorra, haverá o travamento, deslizamento e calo nas pistas das rodas. Quando do cálculo demosntrativo, todos estes pontos serão devidamente observados.

2.7 – Operação e via permanente

Para que um cálculo de definição de timoneria seja bem executado, deve haver estreita relação entre as equipes de operação, via permanente e engenharia de material rodante. Ter o completo entendimento das condições de operação e manutenção, afetarão diretamente as boas condições de frenagem do trem, reduzindo os custos de desgaste e troca dos componentes. Perfil das vias principalmente nas serras, velocidades permitidas nos trechos e cálculo básico de freio estarão sempre unidos para a definição de um bom sistema de timoneria.

2.8 – O Ajustador Automático de Folgas

Assim como a válvula operacional é o coração do sistema pneumático de freio, o ajustador automático de folgas é também o coração da parte mecãnica da instalação. Este componente mantém a distância entre sapatas e rodas, bem como o curso do cilindro de freio para que a força de frenagem não vá diminuindo com o tempo. No passado, até o final dos anos 50, com o passar do tempo e o desgaste das sapatas, a timoneria se movimentava e as folgas somadas no sistema faziam com que o êmbolo do cilindro tivesse um curso cada vez maior para uma mesma pressão de equilíbrio, o que reduzia a força final de frenagem sobre as rodas.

O ajustador automático de folgas, não foi uma invenção da ferrovia norte-americana mas sim dos engenheiros suecos que criaram o dispositivo para reduzir o tempo de atuação das equipes de manutenção que ao trocarem as sapatas desgastadas precisavam ajustar a posição das alavancas manualmente. Hoje, ele é indispensável o mandatório em qualquer tipo de vagão pela segurança operacional que gera.

Durante o exemplo que apresentaremos na Parte 2 deste trabalho, poderemos observar a importância do ajustador de folgas muito ligado à manutenção do curso em qualquer situação e como calcular sua aplicação junto com a definição estrutural de alavancas e tirantes.

Até já!!!

 

1- INTRODUÇÃO

Todos aqueles que amam e fizeram das ferrovias sua vida pessoal ou profissional, têm buscado cada vez mais estudar e aprimorar sua aplicação para que tenhamos uma verdadeira condição de progresso em nosso país. O sistema ferroviário possui em cada uma de suas divisões aspectos que complementam o todo e que acabam sendo muito importantes para que o trabalho flua de forma adequada.

No caso específico do material rodante, além dos tipos conhecidos de vagões classificados como sendo básicos, existem outros que dão suporte à operação e que são tão necessários quanto os primeiros para que o sistema opere com toda segurança e eficiência. São os chamados VAGÕES ESPECIAIS, os quais iremos estudar neste artigo. Na verdade, existe uma série grande de vagões de serviço que poderiam ser chamados de vagões especiais, mas esclareço que não iremos estudar aqui os plataformas e hoppers abertos pertencentes aos departamentos de via permanente de cada ferrovia, usados nas construções e manutenções periódicas. Nosso foco serãos aqueles com funções diferentes das consideradas normais e executadas pelos 5 tipos básicos.

 

2- TIPOS DE VAGÕES ESPECIAIS

 

2.1- VAGÕES REPETIDORES DE AR (REPEATER CARS)

É um nome estranho mas que se justifica pela necessidade de auxílio na manutenção da pressão de ar comprimido dentro do encanamento geral dos vagões para trens longos que circulam nos locais onde o frio é muito intenso. Nesta condição de temperatura, o ar comprimido como fluido que é, tem dificuldades de seguir abastecendo todos os vagões da cauda nas velocidades de aplicação e alívio, o que pode causar sérios perigos à condução do trem. Os repetidores possuem em seu interior um compressor movido a óleo diesel e que entra em ação sempre que a temperatura externa atingir a marca de -10 graus Centígrados forçando o ar a se manter na pressão de trabalho em todos os vagões que estão localizados depois dele. Normalmente os repetidores são vagões fechados que foram adaptados para esta função, como mostrado na Figura 1, abaixo.

Figura 1 – Vagão Repetidor de ar comprimido

Com as modernas práticas ligadas com a tração distribuído ao longo dos trens, onde locomotivas adicionais fornecem além da tração necessária também a complementação do ar para o sistema, os vagões repetidores de ar comprimido vêm gradualmente sendo retirados de serviço.

 

2.2 – VAGÕES CORTA-FOGO (BUFFER CARS)

Estes vagões estão na moda como incremento de proteção contra explosões em caso de descarrilamentos de trens específicos de vagões tanques, conhecidos no Brasil como trens tanqueiros. Como as locomotivas são equipamentos onde existe alta temperatura e condições favoráveis a incêndios caso um dos tanques que esteja acoplado a elas venha a se chocar ou derramar liquido inflamável, os vagões de proteção ou corta-fogo acrescentam uma distância de proteção que dificulta tal ocorrência. Assim, as normas de segurança operacional ferroviária atuais recomendam a inclusão dos vagões corta-fogo, os quais podem ser vistos na Figura 2, abaixo e nos trens da RUMO Logística em suas linhas de bitola 1,60m no estado de São Paulo.

Figura 2 – Vagão Corta-Fogo

Assim como ocorreu com os vagões repetidores de ar comprimido, os corta-fogo foram criados com base em antigos vagões já existentes e disponíveis em função de sua baixa capacidade de carga se comparados aos vagões atuais. Para que possam ser usados acoplados logo após as locomotivas, recomenda-se que eles não estejam vazios e sim carregados com material inerte e de alta densidade como a areia. Isto se justifica para impedir que haja um ponto de instabilidade no trem pois um vagão vazio nesta posição poderia conduzir a uma resultate lateral nas curvas que o faria descarrilar. Para melhorar ainda mais a segurança do trem tanqueiro, os corta-fogo devem ser também equipados com engates de proteção contra engavetamento. Estes engates já foram citados em um post específico, caso você queira entender sua função.

 

2.3 – VAGÕES DE SEGURANÇA DE MANOBRA (SWITCH CARS)

Estes vagões são também chamados de vagões de transferência em algumas ferrovias por facilitarem as equipes de manobreiros na troca de linha de composições inteiras ou parte delas entre pontos de carga ou de descarga nos terminais onde o trem tenha que recuar grande distância. Nesta condição pouco favorável aos maquinistas que não conseguem enxergar o que está ocorrendo na outra ponta do trem, os manobreiros igualmente sofrem pois precisam ficar pendurados no estribo do último vagão, que durante o recuo passa a ser o primeiro. Além desta condição pouco segura, muitas vezes precisam sinalizar passagens de nível e caminhar sob sol e chuva intensos, tornando a operação insalúbre.

Com os vagões de segurança ou transferência, a equipagem de recuo pode ficar protegida do tempo, sinalizar ou mesmo buzinar nas passagens de nível e ter comunicação melhor com o maquinista e com o centro de controle, garantindo um trabalho eficiente e seguro. Veja um modelo na Figura 3, a seguir.

Figura 3 – Vagão de Segurança ou de Transferência

A estrutura destes vagões é muito semelhante aquela utilizada nos antigos Caboose, sendo algumas unidades providas de banheiros e instalações elétricas para permitir o uso de micro-ondas. Normalmente não tem camas ou beliches já que não podem ser usados em viagens mas apenas operar nos terminais e dar suporte à equipagem de manobras, sendo engatados somente para permitir uma condição mais segura e removidos quando a atividade estiver concluída. Seus truques podem ter solução de amortecimento melhores que os truques de vagões mas isto é mais raro de se verificar, ocorrendo apenas quando a ferrovia disponibiliza antigos truques de carros de passageiros para esta finalidade. Os vagões de segurança são muito úteis nas atividades de recuo nos terminais pois a locomotiva fica na extremidade oposta e sem condições de visibilidade para evitar possíveis acidentes.

Desta forma, a equipe de manobras fala por rádio com o maquinista e o previne de algum obstáculo sobre a via ou nas passagens de nível quando algum carro possa transpor os trilhos com o trem em movimento. Como hoje o vandalismo está muito forte em alguns locais, os vagões de segurança também protegem a equipe da ocorrência de assaltos, garantindo a integridade do grupo e do trabalho em andamento. Intemperies são igual motivo para o uso destes vagões.

 

2.4 – VAGÃO LABORATÓRIO / DINAMÔMETRO (DYNAMOMETER CARS)

Estes vagões são usados para o levantamento de dados durante um determinado teste de material rodante novo ou de análise de condições da via permanente. Atualmente, com os recursos de computação disponíveis eles são equipados com uma grande quantidade de equipamentos de levantamento, captação e análise de dados. Os primieros vagões deste tipo foram introduzidos nos EUA no final dos anos 40 quando houve um trabalho a nível nacional para definição dos tipos de amortecimento que seriam aprovados para aplicação nos truques dos vagões em produção, tendo em vista o aumento da velocidade operacional. Portanto, tipos bem primitivos de vagões laboratório foram usados e consagraram desde então seu uso para pesquisa e desenvolvimento.

Figura 4 – Vagão Laboratório da ferrovia BNSF – USA

Na Figura 4 acima, vemos um destes vagões com fabricação exclusiva feita nas oficinas da própria ferrovia, com projeto desenvolvido internamente para adequar a forma de captação e tratamento dos dados no ambiente de análise existente. Já para os modelos primitivos, eram usados antigos carros de passageiros que eram baixados das operações e adaptados para receberem as unidades de levantamento e medição.

Muito comum ver estes  vagões em serviço interno das ferrovias, quando se pretende monitorar os trens em relação aos esforços que atuam sobre os vagões. Truques, sistemas de choque e tração bem como sistemas de freio recebem significativa ajuda destes carros pela medição de esforços longitudinais dos trens, vibrações, impactos, desbalanceamentos, oscilações das caixas, etc.

 

2.5 – VAGÕES GABARITO (CLEARANCE CARS)

As ferrovias possuem um gabarito de livre passagem. Tal gabarito representa a seção em largura e altura permitidas para que o material rodante (vagões, locomotivas e carros) possam circular sem contatos ou choques com as limitações físicas de estações, pontes, cortes, etc. O trabalho realizado pelos vagões gabarito é o de identificar se algo ao longo das vias mudou e que possa gerar perigo aos trens ou mesmo no caso de solicitação da área comercial das ferrovias para a contratação de um transporte especial de equipamentos de grandes dimensões e peso.

Os vagões gabaritos são na sua maioria provenientes de antigos carros de passageiros ou vagões, onde são montadas pequenas barras metálicas que quando abertas e em posição de trabalho garantem a passagem em todos os pontos da seção transversal da via. Caso alguma destas barras se choque contra um obstáculo, o trem é parado e são feitas anotações específicas para identificar a quilometragem da via onde o fato ocorreu.

Figura 5 – Vagão Gabarito

Na Figura 5, vemos um vagão gabarito usado pela antiga Fepasa nas suas linhas de bitola 1,60m, modificado a partir de um dos velhos cabooses da Companhia Paulista. Pode-se também ver claramente a estrutura montada com as barras metálicas de identificação de contato e com a interessante instalação de um limpa-trilhos provavelmente oriundo de alguma locomotiva a vapor sucatada, já que o vagão seguia à frente da locomotiva para identificar qualquer irregularidade com tempo de parada e identificação do trecho.

 

2.6- VAGÃO DE ABASTECIMENTO DE LOCOMOTIVAS (LOCOMOTIVE FILLING CAR)

Com a crescente campanha mundial pela redução de emissões de resíduos de motores à explosão para a atmosfera, bem como por menor uso de combustíveis fósseis, algumas ferrovias iniciaram um projeto para uso do gás natural veicular – GNV em suas locomotivas. Neste conceito de projeto e evitando que o abastecimento fosse prejudicado durante o trajeto, os vagões de abastecimento ficariam instalados entre duas locomotivas adaptadas para queimar 70% de gás e 30% de Diesel. Isto levou a uma definição estrutural de grande tara pois como o gás tem grande volume e é consumido em escala considerável durante as viagens, a perda de peso e os choques entre as locomotivas em tração conjunta, poderia instabilizar o trem gerando o descarrilamento do vagão de abastecimento.

No Brasil, a VALE foi pioneira no desenvolvimento de um vagão de abastecimento de locomotivas em movimento, tendo sido projetados e fabricados dois protótipos para testes de viagem na EF Vitória a Minas – EFVM. A ideia básica era que um vagão fosse acoplado a um par de locomotivas enquanto o outro ficasse em carregamento de gás no terminal, O trem iria até a mina e retornaria ao porto para descarga do minério. Neste momento o vagão vazio seria trocado pelo vagão reabastecido para que mais um ciclo de operação fosse iniciado.

Figura 6 – Vagão para abastecimento de locomotivas com GNV

Interessante também observar na Figura 6, que os engates destes vagões são providos de proteções contra engavetamento (double-shelf) como obrigatório em qualquer tipo de vagão tanque e também possuem folga longitudinal controlada para reduzir os possíveis choques entre as máquinas. Como dito, foram construídas duas unidades para os testes opercionais porém sem a devida continuidade em função das variações de preço e disponibilidade do GNV no Brasil. O projeto geral destes vagões foi da Amsted Maxion para plataforma e componentes ferroviários ficando com a White Martins a definição do tanque e seus sistemas de alimentação e proteção contra vazamentos e demais possiveis acidentes ambientais.

 

2.7 – VAGÕES PARA AFERIÇÃO DE BALANÇA (SCALE CAR)

Como o próprio nome indica, os vagões aferidores de balança ferroviária são usados para controlar a pesagem de vagões vazios e carregados nos terminais próprios ou dos clientes. Seu peso é controlado por meio de um total de material conhecido e acondicionado de forma a sempre deixar o valor pesado dentro da faixa aceitável para os clientes. Normalmentye eles ficam parados em locais específicos de pátios e as ferrovias evitam movimentá-los muito para que o valor de massa total sobre trilhos não seja alterada por qualquer incidente.

Na Figura 7 a seguir, vemos um pequeno vagão de aferição dentro do modelo mais comum usado para este trabalho nos EUA. Veja que é um veículo de diminutas dimensões para que possa entrar e sair de todas as balanças existentes sem a possibilidade de transferência de peso para outra instalação ou via. Salienta-se que apesar das pequenas dimensões, os aferidores de balança podem viajar nos trens quando necessário pois possuem um sistema de freio integrado e freio manual de acordo com as normas ferroviárias existentes.

Figura 7 – Vagão para aferição de balança

Os vagões de aferição podem também possuir dimensões maiores como os da imagem mostrada em destaque no início deste trabalho. São portanto vagões importantes na operação e principalmente na confirmação de transporte para as ferrovias, controlando a difeença entre as quantidades embarcadas e desembarcadas identificadas pelas balanças.

 

2.8- VAGÕES DE AUXÍLIO AOS TRENS DE SOCORRO E TRABALHOS DE VIA (MOW CARS)

Os chamados vagões de auxílio são aqueles que acompanhamos trens de socorro ou de manutenção de via permanente fornecendo todo o suporte necessário ao pessoal que irá trabalhar no trecho, principalmente quando tal trabalho for realizado em mais de um dia. Eles são normalmente produzidos a partir de vagões fechados que não atendam mais aos requisitos de transporte remunerado na ferrovia ou ainda carros de passageiros antigos, principalmente na função de dormitórios.

Os vagões de serviço podem ser cozinhas, refeitórios, dormitórios, oficinas mecânicas, escritórios, etc., inclusive sendo dotados de equipamentos que se conectem à rede WI-FI mais próxima para que seja possivel realizar reuniões com transmissão de dados. Na Figura 8, um típico vagão de serviço neste caso usado em trens socorro como cozinha / refeitório.

Figura 8 – Vagão de auxílio a trem socorro

Como conclusão deste resumo sobre alguns dos vagões especiais, verificamos que eles são tão importantes quanto os chamados vagões remunerados e por isso mesmo precisam ser adequadamente mantidos para que possam executar sua função de maneira precisa e segura. Mesmo que sejam reaproveitados de unidades antigas não se deve negligenciar sua manutenção de truques, sistemas de choque e tração, bem como dos sistemas de freio.

 

1- GERAL:

Até o final dos anos 60 havia uma multiplicidade de classificações de numerações das frotas de vagões das ferrovias brasileiras. Cada uma delas tinha uma forma de codificar cada tipo de vagão em seus sistemas operacional e de manutenção, já adaptada à forma de trabalho na formação e documentação dos trens, nos períodos de manutenção, além do complicado intercâmbio entre as estradas de ferro, gerando muita confusão e transtornos.

Com a formação da RFFSA em 1957 e da FEPASA em 1971, criando dois grandes sistemas, a mencionada diferença de classificação da frota algumas vezes causava o despacho de algum vagão para uma estação indevida ou a liberação de cargas para clientes que não as haviam solicitado. Enfim, as diferenças indicavam que algo deveria ser feito para corrigir o rumo das coisa. Também muito importante lembrar que o uso de computadores, mesmo ainda de forma rústica, pressionava para um modelo que fosse prático e fácil de controlar.

Junto com RFFSA e FEPASA, a Cia Vale do Rio Doce, hoje apenas VALE, também possuia muitos vagões de bitola métrica na Estrada de Ferro Vitória a Minas – EFVM, os quais acabavam entrando nos sistemas das duas novas empresas estatais, com considerações técnicas distintas para o intercâmbio. Como os limites de desgaste e utilização ainda não haviam sido discutidos, o atraso causado quando um vagão de uma operadora “estrangeira” fosse encontrado em um trem de outra, era significativo.

Para começar a acertar estes problemas, era preciso criar um sistema de classificação eficiente e comum a todas as ferrovias, podendo ser introduzido sem conflito nos iniciais computadores. Assim, foi estudado um sistema de classificação que priorizasse os tipos básicos de vagões e que apresentasse suas particularidades comuns a todas. O projeto pioneiro foi denominado de SIGO (Sistema Integrado de Gerenciamento Operacional).

A introdução do SIGO por volta de 1978, gerou a formação de grupos de trabalho que se empenharam na criação de uma classificação que seria obrigatória de uso por todos, já que este era o grande objetivo, ou seja a criação de uma padronização da frota. Era comum de se encontrar nas estações e pátios, grupos de pessoas com escadas, latas de tinta e folhas de controle para sistematicamente trocar a numeração de cada ferrovia por aquele definido e normatizado pela ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas). Hoje após várias atualizaçôes, o documento que mostra  esta classificação comum, é a norma brasileira NBR-11691, a qual serviu de base para estas notas de esclarecimento.

 

2- CODIFICAÇÃO DEFINIDA:

Abaixo podemos ver a Figura 1, onde está o fundamento da classificação definida pelos técnicos ferroviários e que mantem-se válida até hoje.

OBS: Para vagões de serviço interno das ferrovias e que não geram remuneração aos seus proprietários, terão sempre a letra N para X2, independento do tipo básico definido (ex. TN, GN, FN, HN, PN).

Vamos então comentar cada bloco do esquema de classificação para auxiliar a todos que quiserem entendê-lo e utilizá-lo.

 

3- BLOCO DE LETRAS (X1, X2 E X3):

O grupo de letras X1 e X2 nos mostra o tipo básico de vagão e suas características funcionais mais marcantes. Já o grupo X3 apresenta uma forma de aliar a bitola do vagão com seu Peso Bruto Máximo (PBM) sobre os trilhos, o qual será mostrado na Tabela 1. Resolvemos indicar primeiramente os números do grupo X3, já que cada tipo básico terá várias características.

 

3.1- VAGÕES CABUSE:

 

 

3.2- VAGÕES FECHADOS:

 

 

3.3- VAGÕES GÔNDOLAS:

 

 

3.4- VAGÕES HOPPER:

 

 

3.5- VAGÕES PLATAFORMA:

 

 

3.6- VAGÕES TANQUES:

 

 

Verifique que para decifrar a sigla de determinado vagão, será necessário ter todos os caracteres reunidos como no exemplo abaixo:

FHD-636.744-5

F: Vagão tipo Fechado

H: Dotado de escotilhas e tremonhas

D: 80.000 kg de PBM na bitola 1,00m

Proprietário original: RFFSA (numeração iniciando com o número 6)

Quando da oficialização da norma brasileira e sua aplicação em todas as ferrovias, existiam ainda algumas siglas de tipos de vagões que não são mais vistos em nosso dia a dia dos trilhos como os Vagões Gaiolas para transporte de animais, os quais tinham a letra A para designar o seu tipo. Outro tipo que existia e que infelizmente caiu em desuso foram os Vagões Isotérmicos que tinham a letra I. Estes vagões acabaram sendo incorporados à classificação dos vagões Fechados, como hoje ocorre em outros países como nos EUA.

 

4- BLOCO DE ALGARISMOS (X4, X5, X6, X7, X8 e X9):

O Bloco de algarismos, o qual reúne estas indicações, é estabelecido em nível nacional como mencionamos, observando-se alguns detalhes importantes:

a. Proprietários diferentes terão obrigatoriamente códigos diferentes;

b. O número de série específico de cada proprietário é estabelecido pela ANTT através do DNIT e é uma determinação legal;

c. Cada vagão tem apenas um número de série, não podendo ser utilizado por outro vagão, mesmo que o primeiro tenha sido baixado do sistema.

Antigamente quando a codificação entrou em funcionamento, como só existissem 3 grandes sistemas ferroviários no Brasil, estes grupos de números indicavam apenas quatro possibilidades de propriedade:

000.001 a 99.999:   Frotas particulares

100.000 a 299.999: VALE

300.000 a 599.999: FEPASA

600.000 a 999.999: RFFSA

Hoje, em função das novas ferrovias criadas com o desmembramento das anteriores após o processo de privatização, novos grupos numéricos vem sendo estudados pelo DNIT para a marcação dos vagões. Tentamos obter a classificação atualizada mas não foi possivel até a data de publicação deste material.  Ainda é possivel encontrar vagões com numeração conforme acima em meio aos atuais. Isto se deve ao fato de que as frotas existentes quando da privatização foram concedidas e não vendidas, sendo ainda um patrimônio a ser usado, mantido e devolvido caso ao final do período de concessão, a ferrovia for devolvida à união. No entanto, esta possibilidade vem sendo reduzida pois recentemente foi dada pelo governo concedente uma autorização às concessionárias para baixa dos vagões acidentados sem condição de recuperação ou em péssimo estado de conservação, cujo valor de manutenção estivesse acima de uma porcentagem de seu valor patrimonial.

 

5. DÍGITO VERIFICADOR:

O dígito verificador foi introduzido para permitir ao sistema criar uma identificação em caso de digitação incorreta da numeração (X4 a X9) do vagão. Ele é calculado pelo computador com base nesta mesma numeração.

Exemplificaremos a aplicação do dígito verificador na checagem do vagão TNB- 639.712 – 3, tanque não remunerado pertencente à antiga RFFSA 16 com PBM de 64 toneladas e bitola métrica, como visto na Tabela 1.

Primeiramente precisamos separar a parte central do código que é o número  639.712, corespondente de propriedade e aplicar sobre uma dequência de multiplicações que se inicia com o número 7, depois o número 6 e assim sucessivamente. Trabalhando então desta forma, teremos:

6 x 7 = 42

3 x 6 = 18

9 x 5 = 45

7 x 4 = 28

1 x 3 = 3

2 x 2 = 4

Somando todos estes valores, iremos encontrar o número 140. Este número deve ser dividido por 11 o que dará por resto o número 8.

O Dígito Verificador deste vagão, o qual o computador calculará para evitar duplicidade ou troca, será o resultado de 11 – 8 = 3.

Desta forma, toda esta conta é feita para comprovar que o vagão TNB – 639.712 tem o dígito verificador igual a 3.

Esta sequência é válida para o cálculo de todos os DV para vagões. Para os carros de passageiros e locomotivas que apresentam apenas 4 números, a dica é aplicar os números 09 no início da numeração e calcular normalmente o DV. OK?

Como foi mencionado, todo este trabalho foi desenvolvido por engenheiros e técnicos brasileiros e funciona tão bem que até representantes da AAR-EUA, estiveram no Brasil para entender e checar a viabilidade de aplicação nos EUA, o que acabou por não ocorrer em função da quantidade de material rodante existente por lá e já comprometido com os sistemas existentes.

          Continuando com o tema da inscrição do material ferroviário em curvas horizontais, vamos então colocar em prática todos os conceitos, fórmulas e valores, calculando o raio mínimo de um vagão bem específico em função de suas grandes dimensões. A seguir vemos os dados do vagão escolhido:

Classificação ABNT:  FRT

Tipo: Fechado com revestimento interno para proteção da carga

Proprietário / ferrovia: CONRAIL – USA, atual CSX

Carga transportada: Grandes volumes com baixo peso

Peso bruto máximo: 120.000 kg

Capacidade: 71.500 kg

Tara: 48.500 kg

Foto:

 

 

Escolhemos este vagão por seu comprimento e sistema de choque e tração muito particulares. É um vagão provido de engates tipo E68, ou seja, com cabeça E e cauda F, de 1.092mm (43”) de comprimento.

Separemos as características de cada vagão a ser usado, lembrando que usaremos dimensões inglesas, as quais seguirão o texto do procedimento apresentado, sendo posteriormente convertidas. Também, que na localização de inscrição, o FRT deve estar primeiramente considerado na tangente (índice 1) e depois na curva (índice 2):

Dimensões a considerar                                FRT                        AAR

½ faces de tração = B                                      44,29 pés               22,32 pés

½ entre faces de tração = D                           32,81 pés               15,56 pés

Distância do prato ao espelho                       11,48 pés               5,46 pés

Tipo de engate AAR                                        E68                        E60

Indicados estes valores dos vagões completos, vamos checar as dimensões de cada sistema de choque e tração:

Dimensões Padrão                                        FRT                        AAR

Máximo ângulo lateral (θ)                               13°                         7°

Máximo deslocamento lateral (C)                  9,67” (0,806 pés)     3,47” (0,289 pés)

Comprimento efetivo do engate (L)               43” (3,58 pés)         28,46” (2,37 pés)

Comprimento da haste                                    31” (2,58 pés)         21,50” (1,79 pés)

          Como neste caso temos uma ligação feita por um engate tipo E60 com outro do tipo E68, o máximo ângulo de contorno a ser considerado será de 13,5° (Tabela 2 – Parte1), já que ambos possuem cabeças do tipo E.

          Passemos agora ao cálculo da inscrição propriamente dita:

 

Condição A: Vagão FRT circulando desengatado de trem ou locomotiva

Condição B: Vagão FRT engatado a outro vagão FRT

Condição C: Vagão FRT na tangente (índice 1) e vagão AAR na curva (índice 2)

          Equações – situação 1                          FRT              AAR

          Y = 0,625 (B/D) + 0,625                         1,507            1,522

          C = valores Tabela 1 – Parte 1               9,67              3,47

          E = Y1 + C1 + Y2 = C2 /12                    1,347            1,347

          Usando estes valores, teremos:

          Rc = (B2)² – (D2)² – E² / 2E

          Rc = (22,32)² – (15,56)² – (1,347)² / 2 x 1,347

          Rc = 94,43 pés

          Rc = 28.780 mm         

          Verificando então as condições de contorno:

          α = θ1 + β – θ2

          β = Arcsen (B2 / R + E)

          β = Arcsen (22,32 / 94,43 + 1,347)

          β = 13,48°

          Logo,

          α = 13° + 13,48° – 7°

α = 19,48°  >  13,50°                 Ângulo de contorno excedido!!!

          Como o ângulo de contorno entre as cabeças dos engates foi excedido, teremos que aplicar as fórmulas da Situação 2 para ver se localmente o engate do vagão que está na tangente, no caso o nosso FRT, não terá seu ângulo de giro individual ultrapassado, portanto forçando a inscrição.

          Equações – situação 2                                    FRT              AAR

          Y = (0,625 (B/D) + 0,625) / 12                          0,125            0,126

          X1 = Y1(D1+B1-L1) / (D1+B1)                         0,119              —-

          X2 = Y2(D2+B2+L1) / (D2+B2)                           —-              0,138

          E = L2senθ2 + L1sen(θ2+α) + X1 + X2             2,145            2,145

          Usando estes valores, teremos:

          Rc = (B2+L1)² – (D2)² – (E2)²                           

          Rc = (22,32 + 3,583)² – (15,56)² – (2,145)² / 2 x 2,145

          Rc = 98,95 pés

          Rc = 30.160 mm… valor adotado de 30 m

          Checando agora o ângulo de giro individual do FRT:

          θ1 = θ2 + α – β

          β = Arcsen (B2 + L1 / R + E)

          β = Arcsen (22,32 + 3,583 / 98,95 + 2,145)

          β = 14,85°,              logo

          θ1 = 7° + 19,48° – 14,85°

θ1 = 11,63° < 13,00°           Ângulo de giro individual não excedido!!!

Condição D: Vagão AAR na tangente (índice 1) e vagão FRT na curva (índice2)

          Equações – situação 1                          FRT              AAR

          Y = 0,625 (B/D) + 0,625                         1,522            1,507

          C = valores Tabela 1 – Parte 1            9,67              3,47

          E = Y1 + C1 + Y2 = C2 /12                    1,347            1,347

          Usando estes valores, teremos:

          Rd = (B2)² – (D2)² – E² / 2E

          Rd = (43,96)² – (31,17)² – (1,347)² / 2 x 1,347

          Rd = 356,07 pés

          Rd = 108.530 mm… valor adotado de 109 m        

          Verificando então as condições de contorno:

          α = θ1 + β – θ2

          β = Arcsen (B2 / R + E)

          β = Arcsen (43,96 / 356,07 + 1,347)

          β = 7,06°

          Logo,

          α = 7° + 7,06° – 13°

α = 1,06°  <   7°                 Ângulo de contorno não excedido!!!

          Como o ângulo de contorno entre as cabeças dos engates não foi excedido, não será preciso usar as fórmulas da Situação 2.

          Resumindo então, todos os valores de raio mínimo calculados:

Conclusões:

1- O raio mínimo de curva horizontal para que o vagão FRT possa se inscrever sem problemas, será de 109 m;

2- Como os cálculos indicam apenas os limites dimensionais citados para os componentes do sistema de choque e tração, recomenda-se que quando de posse do valor calculado de raio mínimo, tal valor seja aplicado ao projeto do vagão para conferir a abertura total do espelho à direita e à esquerda da linha de centro da viga central;

3- A abertura frontal do espelho é fundamental na definição estrutural da viga central, já que sua parte frontal terá que acompanhar o giro lateral da cabeça do engate, de tal forma que ela não bata no próprio espelho ou mesmo na torneira angular do sistema de freio;

4- As dimensões entre truques e entre faces de tração como vimos, definem o tipo de engate com o correspondente tamanho de haste. Caso todas as condições de cálculo sejam verificadas sem sucesso, o projeto do vagão terá que ser revisto para que se possa usar componentes de choque e tração já homologados;

5- Como as normas AAR são um conjunto de padrões e práticas recomendadas, nossa orientação é para que o engenheiro ferroviário verifique todas as inscrições possíveis de ocorrer, evitando assim surpresas.

Recomendações:

1- Estes cálculos são simples de serem feitos na forma de planilha eletrônica. Sua execução neste formato facilitará os cálculos quando das mudanças dimensionais de posicionamento dos truques;

2- Estude este assunto SEM PRESSA! Faça e refaça tantas vezes quanto necessário!

Uma das grandes dúvidas dos engenheiros ferroviários é o cálculo do raio mínimo de inscrição do material rodante nas curvas da ferrovia. Cada estrada de ferro tem seus perfis longitudinal e vertical derivados de sua implantação nos terrenos de projeto, fazendo com que haja mais ou menos curvas, obras de arte, etc

Desta forma, quando necessitamos especificar locomotivas, vagões ou carros de passageiros, torna-se imprescindível definir suas dimensões limite em função do gabarito e dos raios das curvas. Em resumo, quando calculaos o raio mínimo que um projeto específico possui, o fazemos de fato para comparar com aqueles raios físicos existentes nos trechos concluindo então se nosso veículo poderá circular sem riscos de descarrilamento e para encontrar a dimensão mais adequada e os equipamentos mais indicados para truques e engates.

 As formas de cálculo que resumiremos neste e no exemplo do próximo post, são aquelas usadas pelas ferrovias norte-americanas e que são também adotadas no Brasil por similaridade de funcionamento dos trens longos e pesados que utilizamos. Serão considerados aqui somente os raios mínimos das curvas horizontais, os quais provocam o deslocamento dos dois engates acoplados e das estruturas dos vagões em planta, sendo este de fato o motivo do nosso estudo. A norma também prevê o cálculo de raios mínimos verticais mas não os estudaremos por enquanto por serem menos críticos que os horizontais.

De forma geral, sabemos que os modelos de engates para vagões possuem dois tipos básicos de cabeça de acoplamento, E ou F, mas que suas hastes variam em forma e dimensão exatamente para permitir variações nos ângulos laterais nas curvas. O engenheiro ferroviário deve optar pelo modelo mais adequado tecnicamente.

Os espelhos, que são aquelas peças montadas para proteger as extremidades das vigas centrais, seguem a mesma linha dos engates. Podem possuir base de apoio provida ou não de molas e uma abertura compatível com o tipo de haste do engate. Quanto mais longa for a haste do engate, maior a abertura necessária nos espelhos.

Figura 1 – Montagem dos engates tipo E
Figura 2 – Montagem dos engates tipo F

Observando-se as duas figuras acima, vemos o máximo ângulo de giro, o qual provoca um deslocamento lateral quando dois engates acoplados entram nas curvas. Tal deslocamento, para efeito de cálculo, deve ser considerado desde o ponto onde a haste do engate se conecta com a braçadeira, também conhecido como ponto de pivotamento até as faces de tração das mandíbulas que são as partes que mantém os dosi engates acoplados.

Na Tabela 1, apresentada na sequência, podemos observar os daods básicos de movimentação lateral para os tipos de engate mais usados aqui no Brasil para vagões. Existem outros tipos mas que não serão abordados para que possamos nos concentrar no que realmente será útil a quem quiser utilizar este conceito de cálculo. Para referência na norma AAR, buscar a Seção C-II item 2.1.4.

Já na Tabela 2, temos o máximo ângulo de contorno entre as linhas de centro de dois engates acoplados. A combinação entre os tipos de engate provoca diferentes ângulos de contorno em função das características da geometria da cabeça, do comprimento da haste e da fixação do engate na braçadeira, se por meio de chaveta ou pino.

Para complementar nosso entendimento relativo ao uso dos valores das duas tabelas mostradas, o engenheiro deverá ao especificar seu vagão, indicar o melhor tipo de engate em função de alguns parâmetros como:

* Tipo de engate existente na frota, se E ou F;

* Perfil longitudinal de sua via permanente, com indicação dos raios de curva;

* Formação de seu trem tipo ou possibilidade de formação dos trens

* Como será feita a operação dos trens (tração apenas frontal, remota, auxílio de cauda, etc).

Vejamos a família de engates mais usados no Brasil, os quais são referenciados nas tabelas e que serão citados em nosso texto e cálculos:

Engates E60: Cabeça E com cauda para chaveta

Engates SE60: Cabeça E com anti-engavetamento e cauda para pino

Engates E68: Cabeça E com cauda para pino

Engates F70: Cabeça F e cauda para pino

Na inscrição de dois vagões em uma curva horizontal, a definição dada para o tipo de sistema de choque e tração será fundamental pois um sistema agirá em relação ao outro, gerando ângulos laterais correspondentes aos deslocamentos individuais de cada um dos engates.

O critério mais importante a considerar quando dois engates estiverem na inscrição em determinada curva, é aquele que indica que os engates acoplados se deslocarão lateralmente em relação à linha de centro de cada viga central e que ando isto ocorrer suas hastes não encostem nas laterias dos espelhos, já que estes determinam a abertuta limite. Caso haja este contato çateral, o vagão menor e com menor abertura de espelho, além de menor tara, poderá ser pressionado pelo vagão maior e mais pesado para fora da via até que as pistas percam contato com o boleto do trilho e o vagão descarrile.

Como o cálculo do raio mínimo provém da norma AAR (Association os American railroads), ele utiliza fórmulas empíricas provenientes de estudose testes práticos que relacionam a posição dos veículos como se um deles estivesse na via tangente (reta) imediatamente anterior à entrada da curva e o outro como se já na curva estivesse.

Sabendo que o comprimento dos vagões pode variar muito em função do produto que eles transportam, a norma estabelece para facilitar nossa análise, a existência de um “vagão base AAR” provido de engates tipo E (E60) com comprimento de haste e dimensões conhecidas e mostradas a seguir. Combinar o vagão específico que estamos querendo checar e cujo raio mínimo precisa ser calculado, com o “vagão base AAR”, será o nosso trabalho na continuidade e no exemplo prático da continuação no próximo post.

Sempre se deve seguir a dias verificações básicas:

A- Estando o “vagão base” na tangente e o novo projeto na curva;

B- Estando o “vagão base” na curva e o novo projeto na tangente.

Em ambas as condições o ângulo de contorno entre as cabeças deve ser checado para sabermos se é ultrapassado em relação aos valores indicados na Tabela 2 que foi apresentada acima.

São as seguintes as dimensões do “vagão base AAR” para os cálculos:

* Comprimento entre faces de tração dos engates: 13.600mm (44,62 pés)

* Comprimento entre espelhos: 12.800mm (42,00 pés)

* Comprimento entre centros de truques: 9.470mm (31,96 pés)

* Distância do pião à face do espelho (over hang): 1.665mm (5.46 pés)

* Folga entre o engate e o espelho: 95mm (0,31 pés)

Fica então a pergunta: EM QUANTAS E QUAIS SITUAÇÕES TEMOS QUE CHECAR A INSCRIÇÃO PARA ENCONTRAR O VALOR DO RAIO MÍNIMO PARA NOSSO VAGÃO ESPECÍFICO? Vamos então citar estas condições de verificação e tentar entender cada uma delas:

I- Vagão circulando desengatado de trem ou locomotiva-

Esta condição pode parecer incomum mas é usada nas manobras de pátios de gravidade muito usados nos EUA, quando os vagões são soltos em rampa e passam por vários AMVs de via diferentes para a formação simultânea de vários trens. Recomendo assistir vídeos no You Tube que tenham no título o termo em Inglês HUMP YARDS, para melhor visualização desta situação. Então, os raios mínimos desta condição são os seguintes:

Porém, como os vagões também circulam engatados nos Hump Yards e estes pátios não formam a maioria dos trechos para manobras ou viagens, igualmente necessário se torna checar os ângulos de contorno dos engates do vagão de projeto e do “vagão base” nas duas situações descritas anteriormente, ou seja, em tangente e curva.

II- Vagão engatado a vagão igual e de mesmo projeto –

A norma indica para esta condição os seguintes valores:

III – Vagão engatado ao “vagão base”, ora em tangente, ora em curva –

Em circulação normal cada valor calculado nestas condições deve ser comparado com os demais valores para se definir o valor oficial do raio mínimo, lembrando que este será aquele que for o maior de todas as verificações.

Vamos então passar a estudar as fórmulas para cálculo de raio mínimo para curvas horizontais, tomando por base alguns preceitos comprovados fisicamente. A condição mais crítica é a inscrição de tangente e curva sem uma compensação de gabarito lateral como aquela encontrada em trechos antigos de nossas ferrovias. Nesta condição, como já mencionamos anteriormente, um dos vagões está na tangente no ponto exato de entrada da curva e o outro, já dentro da curva propriamente dita.

Normalmente o pior caso ocorre quando o vagão mais curto está na tangente, o que não elimina a necessidade de estudar o caso oposto. Assim, dois vagões engatados e ambos equipados com engates tipo F podem apresentar uma condição mais restritiva em termos de ângulo de contorno do que se fossem equipados com engates do tipo E.

Para utilizar as fórmulas de cálculo, os itens com índice (1) devem ser tomados para o vagão que estiver na tangente e os itens com índice (2) para aquele que estiver na curva.

Observemos atentamenteos dois esquemas que se seguem e veremos que os cálculos são baseados em pura geometria e análise angular. O restante é visualizar a movimentação dos vagões para saber se nas condições de inscrição poderá ou não haver um final de giro lateral que possa comprometer a segurança operacional.

Esquema 1 – Dois vagões na inscrição
Esquema 2 – Detalhe entre os dois engates

Nestes esquemas, retirados da norma AAR, vemos as dimensões e ângulos que são citados nas fórmulas a seguir sendo que o segundo deles é uma ampliação do que ocorre entre os pontos P1 e P2 do primeiro esquema, ou seja, um facilitador de visualização de limites de hastes, folgas e deslocamentos das duas cabeças de engate acoplada.

SITUAÇÃO 1: Raio mínimo determinado pelo ângulo de contorno ALFA.

Fórmulas:

R = (B2)² – (D2)² – E² / 2E                             Equação 1

E = Y1 + C1 + Y2 + C2 / 12                            Equação 1.1

Y = 0,625 (B / D) + 0,625                               Equação 1.2

β = Arcsen (B2 / R + E)                                   Equação 1.3

α = θ1 + β – θ2 Equação 1.4

Onde:

R = Raio mínimo calculado

B = Metade da distância entre as faces de tração dos engatesâ

D = Metade da distãncia entre truques

E = Deslocamento lateral total entre as linhas de centro dos vagões

C = Máximo deslocamento lateral permitido para cada tipo de engate

Y = Deslocamento lateral na linha de centro dos vagões

α = ângulo de contorno horizontal

θ = Máximo ângulo lateral de cada engate

β = Ângulo horizontal entre as linhas de centro

Condição: No caso da equação 1 resultar em um ângulo de contorno horizontal que exceda os limites da Tabela 2, aplicar as fórmulas da Equação 2, a qual leva em consideração uma análise geométrica mais aprofundada pois verifica o deslocamento lateral não apenas do conjunto mas de cada um dos engates envolvidos. Para isso, cada condição de giro é verificada, gerando um novo valor de ângulo a ser checado, agora com os vaçores individuais mostrados na Tabela 1.

SITUAÇÃO 2: Raio mínimo determinado pelo ângulo de cada um dos engates relativamente à linha de centro do vagão.

Fórmulas:

R = (B2 + L1)² – (D2)² – E / 2E                   Equação 2

E = L2 sen θ2 + L1 sen (θ2 + α) +X1 = X2     Equação 2.1

X1 = Y1 (D1 = B1 – L1) / (D1 + B1) Equação 2.2

X2 = Y2 (D2 + B2 + L1) / (D2 + B2)                Equação 2.3

Y = (0,625(B / D) + 0,625) / 12                        Equação 2.4

β = Arcsen (B2 + L1 / R + E)                           Equação 2.5

θ1 = θ2 + α – β Equação 2.6

Conhecidas estas situações de inscrição, nosso objetivo agora será o de exemplificar a aplicação destes conceitos na determinação do raio mínimo, o que será feito no proximo post.

Nossa sugestão, é que antes de iniciar a leitura e os cálculos da próxima publicação, se busque entender bem as figuras geométricas dos vagões em curva. Isto facilitará bastante a compreensão!!

Em resumo, inicie sempre pela SITUAÇÃO 1 e verifique o ângulo de contorno calculados para os dois engates acoplados. caso o limite deste ãngulo seja ultrapassado, faça nova verificação pela SITUAÇÃO 2 para verificar se o ângulo de giro lateral individual do vagão que está na tangente foi ultrapassado. caso seteja dentro, o valor de raio mínimo deve ser separado para comparação com os demais valores calculados para que se encontre o Raio Mínimo geral, o qual será o maior de todos os valores encontrados.

Caso a SITUAÇÃO 2 esteja fora dos limites, retornoe ao projeto do vagão e modifique as dimensões entre faces de tração e entre truques, fazendo novas verificações até que o equilíbrio seja encontrado.

 

 

Caros amigos, já conversamos várias vezes sobre o problema de diferença de bitolas no Brasil e o porque desta característica em nossas ferrovias. O fato, como também já abordamos, tem origem no recebimento de nossos primeiros trens, os quais eram equipamento de segunda mão já que os países que iniciaram a implantação dos trilhos estavam padronizando suas bitolas e tinham que fazer dinheiro com o material que era retirado de serviço. Nossa querida Baroneza portanto, não chegou por aqui como nova!

O que iremos comentar neste post de hoje faz referência a um tipo de vagão que existe somente aqui no Brasil: O vagão Madrinha. Na realidade o termo madrinha já está um pouco desgastado por ser usado em outras situações que procurem fazer uma ligação entre equipamentos e componentes de tipos diferentes como truques, freio, engates,etc. Porém, nosso Madrinha é aquele que permite que locomotivas de bitola 1,60m puxem trens de bitola 1,00m e vice-versa, apesar desta última alternativa não estar em uso. Além disso, os Madrinhas somente circulam em vias onde existe a conhecida bitola mista ou bitola de três trilhos, implantada na região entre Campinas-SP e Santos-SP para liberar um maior fluxo de transporte para a descarga de grãos que vêm do interior do Mato Grosso do Sul para exportação. A bitola mista seria uma solução para nossas ferrovias e permitiria que os trens da estreita circulassem nas linhas da larga, integrando muito mais o país. Mas, este é um outro assunto a ser tratado com mais detalhes e em outra oportunidade, já que envolve não apenas a parte técnica mas também o bom senso e a ganância de dirigentes de empresas que preferem virar as costas à integração do sistema e às oportunidades de negócio que ela traria.

Voltando então ao vagão Madrinha propriamente dito, ele deve ter uma característica básica: sua tara ou como preferem alguns, seu peso próprio. Ela é fundamental para o bom funcionamento do vagão já que imaginemos um trem de cerca de 100 vagões graneleiros de bitola métrica, muito comum hoje na VLI. O Madrinha deve ser engatado logo após as locomotivas da larga e caso ele não possua um peso que seja equivalente a um vagão carregado, poderia instabilizar o trem. Veja a Figura 1 a seguir.

Como estudamos em artigos anteriores, em todas as rodas de qualquer tipo de vagão existe um binário de forças: lateral e vertical. É a relação L / V que mantém os vagões em circulação estável, sendo que nesta relação a força vertical sempre deve ser maior que a força lateral pois caso estes valores se invertam, a roda pode escalar o boleto dos trilhos e o vagão descarrilar.

O Centro de Gravidade (CG), local onde está o centro de massa do vagão, tem que ser baixo como dissemos para ajudar no mencionado equilíbrio de forças sobre as rodas pois caso ele seja muito leve, possuirá carga vertical baixa em relação aos vagões carregados do trem podendo em uma determinada curva ser deslocado para o lado externo pela ação combinada da força centrífuga e como reação à tração das locomotivas e ao peso dos vagões carregados. Possuindo o Madrinha um peso equivalente aos demais vagões carregados do trem, as forças sobre as rodas tenderão a se equalizar e a circulação manter-se sob controle.

 

Figura 1 – Trem de locomotivas de 1,60m com vagão Madrinha para vagões HFE de bitola 1,oom

Lógico que tratamos aqui de uma inscrição considerada normal e teórica, com todos os componentes em condições plenas de uso. Porém na vida real, os desgastes e as manutenções contínuas (ou a falta delas) vão modificando as características de muitos dos componentes, principalmente dos truques, onde a suspensão composta de molas helicoidais vai perdendo altura com o tempo e pode tornar-se sólida (molas fechadas) em uma curva onde as condições de superelevação estejam fora do indicado em projeto. Assim, um trem que possua vagão Madrinha terá que ser inspecionado antes de sua liberação para circulação de forma mais rígida que aquela realizada para um trem considerado comum.

Podemos observar na Figura 2, uma foto de um trem com vagão Madrinha da VLI em direção a Santos-SP, onde se pode ver de forma destacada sua superestrutura de baixa altura, composta de um grande contra-peso formado por uma caixa metálica onde foram colocadas rodas sucatadas e outros materiais ferroviários de grande peso, envolvidos por concreto injetado. Todo este peso constante foi calculado para ter uma equivalência com a lotação dos vagões do trem, evitando que haja um ponto fraco no sistema.

Mas não são somente estas as características funcionais e de projeto de um vagão Madrinha. Além do peso equivalente à condição carregado, estes vagões também precisam de outros componentes especiais como os engates. Quando dos primeiros projetos dos vagões Madrinha, os protótipos contemplavam dois engates em cada extremidade, sendo um com altura de 990mm para a bitola de 1,60m e outro mais baixo com 750mm e deslocado lateralmente para o acoplamento dos vagões da métrica. Esta solução se mostrou mais cara em termos de componentes e manutenção.

O projeto atual possui apenas um engate, tendo o sistema de choque e tração modificado para permitir uma angularidade lateral maior que o padrão normal dos engates tipo E que possui 7 graus. No novo sistema, o valor desta angularidade passa para 13 graus o que permite um melhor deslocamento sem afetar a inscrição. Com mesta solução foi necessário desenvolver um engate com haste de 1,50m de comprimento e um espelho (abertura da extremidade da longarina central) de aproximadamente 700mm de largura, como se pode ver na Figura 3.

                          Figura 3 – Posição do engate especial para a extremidade do vagão Madrinha com mandíbula de 483mm

Outro ponto interessante neste tipo de projeto são as mandíbulas dos engates. Elas que normalmente possuem 280mm (11″) de altura, precisam ter agora 483mm (19″) para poderem cobrir todas as possibilidades de acoplamento entre as locomotivas e o trem, como por exemplo rodas desgastadas, molas “cansadas” e vagões carregados. Esta diferença trouxe outro problema para as ferrovias que foi o índice de quebra destas mandíbulas especiais em serviço pois com os acréscimos de altura há um momento torsor sobre elas gerando uma carga adicional que pode quebrá-las durante a tração. Os fabricantes de engates têm se desdobrado para gerar um produto sem qualquer tipo de falha para que a aplicação dos vagões Madrinha siga sendo uma opção importante na integração das duas bitolas.

Além dos engates, também nos truques, as rodas não podem circular na sua última vida, ou seja, na sua condição limite de uso. Como todos sabemos, cada roda normalmente é usinada 3 vezes em sua bandagem para a recuperação de seu perfil de rolamento e friso. No caso do Madrinha a última vida de roda, que é aquela onde as rodas possuem menor bandagem, a diferença com a locomotiva da larga ou vagões da métrica aumentaria o momento torsor nas mandíbulas, gerando maiores quebras e paralisação dos trens ao longo do trecho. Assim, todos os Madrinha somente podem circular com rodas novas ou no máximo na segunda vida.

Os vagões Madrinha seguem operando normalmente nas linhas da VLI e também em alguns trechos da Rumo, que foi a ferrovia que desenvolveu a solução para aplicação em trens de longo percurso. Antes dela, estes vagões eram e ainda são usados somente no pátio do pool de vagões tanque de Paulínia, no posicionamento dos vagões tanto da larga quanto da métrica nas baias de carregamento, sendo que alguns destes vagões híbridos também foram vistos nas oficinas do Horto Florestal em BH, hoje pertencentes à MRS logística, quando o sistema ainda era administrado pela RFFSA, já que neste local chegavam os trens da SR3 (bitola 1,60m) e da SR2 (bitola 1,00m). Os Madrinhas são o exemplo clássico do ditado que diz que “a necessidade é que faz o sapo pular”.

 

 

 

Como já tivemos a oportunidade de discutir nossas ferrovias eram, até o final dos anos 40, equivalentes em funcionamento com as principais ferrovias norte-americanas. Quando digo isso me refiro às grande ferrovias nacionais que movimentavam cargas e pessoas em volumes consideráveis e compatíveis com o nível tecnológico existente deste lado do planeta.

Nossas E. F. Central do Brasil e Cia. Paulista, ambas de bitola de 1,60m, eram comparadas às grandes Union Pacific e Santa Fé nos EUA embora as suas irmãs do hemisfério norte contassem sempre com mais recursos e menor dependência de seus politicos, sempre uma ameaça pairando sobre nossas cabeças! Nos livros Car Builders Cyclopedias, que eram publicações especializadas em material rodante distinadas aos que trabalhavam com ferrovia, citavam estas duas estradas de ferro como um exemplo de trabalho e eficiência. Todos se recordam que nossos avós até costumavam acertar os relógios pela chegada dos trens nas estações, sendo motivo de comentários quando ocorriam atrasos.

Mas nosso tema deste post faz menção a um tipo de vagão que foi criado nos EUA mas que não teve a mesma aplicação por aqui. Falo dos vagões do tipo Caboose, os quais foram criados em 1840 quando os trens começaram a aumentar seu comprimento e os vários vagões tinham destinos e encomendas diferentes, sendo então necessário um maior controle de entrega destes materiais pelas estações ao longo do país. O que pouca gente sabe é que o nome Caboose não nasceu ferroviário mas sim maritimo já que as cozinhas e os locais onde os marinheiros se concentravam nos navios tinham este jargão que tem fontes germânicas, holandesas, etc. O nome que surgiu como uma gíria se popularizou rapidamente já que também era usado pelos índios como um nome dado para os trens e ainda para indicar nádegas bem avantajadas das mulheres da época. Um gosto antigo, como se vê……

Os cabooses, em resumo, eram usados pelos chefes de trem para concentrarem as informações e notas do que estava embarcado e para controlar sua entrega. Neste mesmo vagão seguia a equipe de guarda e manutenção do trem, composta normalmente de guarda-freios e mecânicos que lá estavam para reparar qualquer defeito que pudesse impedir a continuaidade da viagem. Ferramentas, beliches, fogareiros, etc, eram outros equipamentos obrigatórios para estas pessoas que passavam mais tempo nos cabooses do que em suas próprias casas.

                                        Figura 1 – Um caboose totalmente totalmente fabricado em madeira

Como mostra a Figura 1, os primeiros cabooses eram totalmente de madeira com estrados dotados de tirantes para garantir sua integridade pois como seguiam nas caudas dos trens, recebiam impactos oriundos do movimento longitudinal ainda precariamente amortecido já que não haviam aparelhos de choque especificamente projetados para esta finalidade como ocorreu mais tarde. Porém, o ponto que mais identificou este modelo de vagão era sua cupola superior, que foi criada para que o conductor, ou chefe de trem, pudesse observar o trem de um ponto acima das coberturas dos vagões. Em casos de emergência decisões podiam ser tomadas a partir deste ponto, além da comunicação com o maquinista e os guarda-freios que circulavam nas coberturas para apertar os freios manuais. Com a normal evolução, a cupola também passou a ser dotada de válvulas de emergência para aplicação de freio, luzes de sinalização e até armamento concedido ao condutor para proteger seu trem de assaltantes.

Os cabooses ficaram tão populares nos EUA que não se concebia um trem de carga sem que eles estivessem na cauda. As ferrovias aplicavam neles cada vez maior tecnologia de comunicação e prevenção de acidentes, sendo a comunicação via radio com o maquinista apresentada em congressos anuais como uma verdadeira revolução na segurança do então prioritário sistema ferroviário. Importante lembrar que os trens de passageiro não tinham caboose em função da facilidade do chefe do trem ter sua cabine em um dos carros, normalmente nos bagageiros ou em um assento próximo ao vestibule nos carros de segunda classe. Ô tempo bom!!!!!!!!!

Todos também sabemos que os trens americanos cresceram muito rapidamente em peso e comprimento em função do uso do carvão mineral para gerar energia nas usinas termo-elétricas. Com a necessidade da aplicação de uma locomotiva de auxilio (helper) em alguns locais da via em função de rampas mais fortes, os cabooses tiveram que sofrer algumas modificações estruturais tais como uma construção totalmente metálica para suportarem a força de empuxo desta última máquina serra acima. Os cabooses de madeira não suportavam esta técnica da operação e foram logo renegados aos trens de carga geral até sua substituição por vagões mais modernos.

                                 Figura 2 – Caboose com estrutura totalmente metálica para serviço em trens de carvão

Vemos ana Figura 2, um deste vagões mais resistentes em uma de suas últimas pinturas pela Conrail, ferrovia formada pelo antigo sistema da Pennsylvania RR, uma das maiores e mais importantes ferrovias do mundo.

Outro ponto de evolução se concentrou na cupola já que os novos projetos de vagões com maior altura e largura úteis, direcionaram a necessidade de observação para cima e para os lados. As cupolas então ficaram mais amplas e abrangentes, sobressaindo lateralmente para dar aos seus operadores melhores condições de trabalho. O vagão da figura a seguir nos mostra bem esta característica.

                                                Figura 3 – Caboose com cupola abrangente e com maior visibilidade

Os cabooses também eram usados para outras aplicações como transferência de vagões entre terminais, controles de manobras e até escritórios móveis para empresas que prestavam apoio ao serviço ferroviário. Importante citar aqui que os cabooses como eram direcionados a pessoas, suas condições de conforto deveriam ser o mais adequadas pois como dissemos estes funcionários ficavam a maior parte do tempo embarcados em viagens longas e cansativas. Assim, os sitemas de truque e de choque e tração tiveram projetos específicos e direcionados ao melhor amortecimento dos impactos e vibrações. Os truques destes vagões passaram a ter uma suspensão composta de molas helicoidais somadas a feixes de mola, muito próximos daquelas usadas nos carros de passageiro. Os truques de vagões eram muito desconfortáveis para trabalhos em  distancias maiores. Também os aparelhos de choque foram aprimorados e chegaram a existir modelos próprios aos cabooses. Muitos colegas americanos de mais idade me disseram que os aparelhos de longo curso surgiram em função dos cabooses e tiveram sua aplicação extendida a outros vagões que necessitavam de melhor absorção  como os fechados usados para cargas mais sensíveis e plataformas para bobinas, onde a carga não pode se movimentar.

                                      Figura 4 – Truque usado em vagões caboose com feixes de molas e molas helicoidais

No Brasil, algumas ferrovias usaram os cabooses porém de forma não tão sistemática como nos EUA. As mais antigas como a Leopoldina, a Sorocabana, a Mogiana e até a São Paulo-Minas os utilizaram em alguns trens. Das maiores, a Paulista tinha uma espécie de caboose com compartimentos para cargas especiais e truques com rodas raiadas que até hoje são famosos e procurados para fotos para modelos e preservação. Já no periodo da estatização, RFFSA, Fepasa e Vale do Rio Doce também usaram cabooses em suas operações mas todos eles acabaram sendo sucateados por múltiplos motivos, sendo infelizmente o motivo mais comum o roubo de seus equipamentos como torneiras, vasos sanitários e até fiação elétrica. Nossa pouca cultura aliada ao extremo da necessidade de algumas pessoas ajudou a erradicar os cabooses de nossas paisagens ferroviárias.

         

                                     Figura 5 – Exemplos de cabooses brasileiros (Leopoldina, Mogiana e Paulista)

Mas fica a pergunta: Qual o principal motivo de seu desaparecimento do ambiente onde eles foram criados? A resposta vem com o progresso das comunicações e da necessidade de competição da ferrovia com outros tipos de modais. Com os modernos rádios já não havia motivo para sinais e sons de aviso, já que o contato era imediato e de boa qualidade. Também não se justificava manter viajando pessoas que tinham que comer, dormer e receber salários diferenciados por trabalhos que se extendidam por dias seguidos. A manutenção dos cabooses também tinha custo elevado para que eles seguissem mantendo boa qualidade de trabalho, sem falamos no computador que se propagava rapidamente, realizando trabalhos que eram totalmente feitos por pessoas que poderiam ser deslocadas para outras funções. Até o simples controle de pressão de cauda, informado pelo condutor ao maquinista foi substituído por equipamentos que são vistos até hoje e que são presos aos engates do último ou penúltimo vagão do trem e que enviam imediatamente o valor de pressão no encanamento geral do ultimo vagão. Enfim, coisas que vêm para auxiliar na comunicação e na realização de trabalhos do dia a dia, acabam por substituir equipamentos e pessoas.

Os cabooses como outros tipos de vagões hoje são lembrados pelos ferroviários com saudade pois estes sabiam que para neles trabalhar era preciso gostar do que se fazia e ter sobretudo coragem e amor pelos trens, coisas que vão ficando cada vez mais raras. O que prevalence hoje são apenas números frios e contas a fechar, as quais muitas vezes servem somente para maquiar interesses pessoais em detrimento do conjunto.

Com o aumento e peso dos trens modernos, muitos aspectos que anteriormente não tinham tanta importância, agora são críticos para uma operação segura e produtiva. Acidente na ferrovia é um assunto extremamente complexo pois os danos gerados causam prejuízos imensos. Quando temos perdas de transporte os seguros podem ajudar a cobrir as despesas, embora a imagem da ferrovia ser um transporte seguro e de grandes volumes fique comprometida. O grande e real problema se dá quando há perdas de vidas humanas, evacuação de cidades por perigo de nuvens tóxicas ou contaminação de fontes de abastecimento. Isto não pode ser pago!!!

Porém, o mundo segue crescendo e suas necessidades de consumo também. As indústrias têm planos e projetos de melhores resultados e todas estas diretrizes conduzem ao custo do transporte, ou seja, ferrovias. O Brasil ,como ponto fora da curva, prossegue insistindo que as rodovias são a resposta e por isso vai ficando cada vez mais à mercê de interesses politicos sem planos para o país e sim somente para partidos politicos.

Voltando aos trens e sua vocação de movimentar grandes volumes, os estudiosos e estatísticos começaram a ver que muitos dos acidentes que ocorriam com trens de vagões tanques eram devastadores devido ao engavetamento que ocorria quando um bloco de vagões saía dos trilhos e outros blocos se chocavam contra ele. Os engates automáticos convencionais se deslocavam no sentido vertical e perdiam o contato, indo muitas vezes romper a calota do tanque imediatamente a sua frente.

Acidente tanques 1                    Acidente tanques 2

Nas fotos acima, podemos ver um exemplo de descarrilamento ocorrido aqui no Brasil por quebra de trilho e que causou o engavetamento de dois vagões tanques TCD e o consequente vazamento de 60.000 litros de óleo diesel, que atingiram um pequeno córrego próximo da via causando sua contaminação.

Especificamente na segunda foto podemos ver o engate do vagão que causou a perfuração ainda preso à calota do tanque que vazou, lembrando que os danos poderiam ter sido muito maiores caso tivessemos tido uma explosão com consequências imprevisíveis. O produto branco que aparece na foto é um composto químico que se torna vedante ao contato com o óleo diesel.

Para este tipo de acidente, foi então criado o engate cujo nome original é Double Shelf, ou seja, engate com dupla proteção contra engavetamentos. Este tipo de engate é igual ao convencional e se diferencia por possuir complementos superior e inferior que não permitem que ele se solte do engate ao qual esteja acoplado, indo perfurar o tanque da frente.

Engate Double-shelf                            ENGATE-SE60-3

 

Nas figuras podemos ver claramente os reforços e a proteção adicional de dois engates deste tipo quando acoplados.

Os engates Double Shelf podem ser aplicados a qualquer projeto de vagão tanque, sendo hoje uma obrigatoriedade em todas as ferrovias que seguem os padrão da Association of American Railroads-AAR, como ocorre aqui no Brasil, embora muitos dos ferroviários considerem que eles são realmente bons quando a questão é o engavetamento mas que falham quando se passa a discutir o tombamento. A principal alegação dos que não gostam tanto dos Double Shelf é que caso um vagão descarrile e tombe ele acaba por tombar o tanque a ele engatado e assim sucessivamente, pela dificuldade deles se soltarem.

Consultando amigos que participam das reuniões dos Comitês de Normalização da AAR nos EUA, eles alegam que tal preocupação também fez parte das discussões quando da criação deste modelo mas que analisando todas as possibilidades de desastre ambiental e risco de vida a todos que convivem com os trens, a decisão foi por minimizar os efeitos do acidente, deixando que se necessario os tanques tombem mas que não furem, ocasionando o derrame de produto ou explodam.

Todas as ferrovias no Brasil já são obrigadas a usar os Double Shelf por força de legislação e normalização ABNT.

Todos aqueles que gostam das ferrovias ficam preocupados quando no noticiário aparecem notícias negativas a elas, tais como os acidentes, especialmente aqueles onde tenham havido vítimas fatais. Sempre é um impacto muito grande já que especialmente no Brasil temos lutado muito para manter vivas as nossas estradas de ferro, ainda não usadas como deveriam já que o lobby rodoviário persiste forte.

Nosso trabalho hoje é mostrar que apesar do lado negativo, os acidentes sempre impulsionam novas soluções e técnicas para que eles não voltem a acontecer. Foi assim que naquele triste dia de 6 de julho de 2013 um trem unitário de vagões tanque se acidentou na cidade canadense de Lac-Mégantic onde a explosão dos vagões causou um terrivel e devastador incêndio, ceifando 47 vidas. Após este fato e em decorrência do aumento significativo do transporte de óleo combustível derivado de Xisto Betuminoso, abundante nos EUA e com demanda alta de consumo na indústria Norte-Americana, os fabricantes de vagões, universidades e a Associação Americana de ferrovias (AAR) se uniram para encontrar um novo caminho mais seguro e que viesse a dotar os vagões e todas as comunidades por onde os trens de oleo circulam de soluções que minimizem os efeitos causados pelos acidentes.

Na figura a seguir vemos um típico vagão tanque para este tipo de óleo combustível, classificado pelo Departamento de Transportes como DOT 111. Normalmente são tanques pintados na cor preta pois normalmente o óleo combustível necessita de calor para manter-se fluido e a cor escura o retém, facilitando a operação de sua descarga.

 USA-TCT-23

No acidente em Lac-Mégantic, após decorrido o periodo  para sua investigação, os técnicos e engenheiros verificaram que o óleo derivado de Xisto possui uma fluidez maior que o óleo combustível de baixo ponto de fluidez (BPF) e que também possui uma maior capacidade de formação de gás no interior do vaso cilíndrico do vagão. Quando o trem se acidentou e com o descarrilamento que geralmente gera faíscas, a explosão foi devastadora, com varíos vagãos se rompendo em série, muito motivado pelo gás altamente inflamável. O local do acidente permanceu queimando por cerca de 3 dias já que não era possivel uma aproximação aos bombeiros em fnção do extreme calor gerado pelo oleo em combustão. Uma das testemunhas disse que viu carros serem derretidos, postes entortarem e construções desaparecerem em decorrência deste incêndio.

Além das providências geradas nas comunidades, os projetistas de vagões foram “incentivados”pelas autoridades a modificar o projeto básico dos tanques DOT 111, então considerados como insuficinetes para evitarem estas tragédias. Após cerca de 2 anos de estudos e testes, a AAR e os fabricantes de vagões chegaram a um novo projeto mais seguro e que realmente minimiza a possibilidade de explosões ou derrames de combust’vel ao meio ambiente. Foi então criada a nova classificação DOT 117, a qual basicamente se caracteriza por:

1- Isolamento Térmico: Foi criada uma camada de 100mm de espessura em torno de todo o corpo cilíndrico formada por poliuretano expansível e que visa proteger o tanque do calor e com ele o aumento de pressão no interior do corpo caso haja fogo externo;

2- Cabeceiras: Os novos tanques 117 possuem projeto onde as calotas, que são aquelas partes arredondadas e que fecham o corpo cilíndrico, são fabricadas de chapas de aço de maior espessura. Além destas chapas, também estão sendo aplicadas proteções extras contra impactos diretos, chamadas de head shields (escudos de cabeceira);

3- Proteção de fundo: Para impedir que ao se acidentar os tanques vazem pelo fundo, local onde se encontra a válvula de descarga, os projetistas bolaram uma proteção que direciona a quebra da tubulação para um ponto de fraqueza pré-determinado, preservando esta válvula e impedidndo a perda do produto e consequente contaminação ambiental ou explosão;

4- Corpo cilindrico: As chapas usadas nos tanques DOT 117 que venham a transportar o óleo combustível de Xisto, obrigatoriamente hoje precisam ter uma maior espessura que aquela usada nos DOT 111. Isto também aumenta a resistência contra perfurações nos descarrilamentos. Esta proteção é muito útil apesar de causar um aumento significativo da tara do vagão;

5- Freios: Como uma das razões identificadas como causa do acidente em Lac-Mégantic foi a falha operacional do sistema de freios, já que o trem se desgarrou após uma operação incorreta do maquinista ao parar o trem em um pátio alguns quilomentros adiante da cidade. Segundo ele a operação foi considerada adequada mas que se mostrou falha para impedir que o trem se soltasse e retornasse de ré e desgovernado até tombar em uma curva próxima de uma passagem de nivel. Assim, a comissão de apuração recomendou que os vagões deste serviço específico sejam dotados de freios a ar com válvulas de comando eletrônico, as quais quando acionadas têm ação quase instantânea, reduzindo a distância de parada dos trens. Este é o ponto mais polemico do relatório de causa do acidente pois o sistema de freio recomendado tem valor extremamente alto se comparado ao convencional apenas acionado por queda de pressão do ar comprimido na tubulação de freio dos vagões e que certamente irá impactar no preço de compra das muitas unidades em produção;

6- Engates: Para o sistema de choque e tração, a comissão recomendou maior rigidez na aplicação de engates que não permitam encavalamento quando de um grande impacto. tais engates conhecidos como double-shelf (dupla proteção) já vinham sendo usados em todos os tipos de tanques mas para esta série específica, o controle de desgaste e o sistema de amortecimento necessitam de revisões mais constantes e manutenções preditivas.

7-Operação: A velocidade dos trens com este tipo de compbustível provavelmente sera reduzida em relação aos demais trens onde existam vagões tanque. Esta igualmente é uma decisão polêmica pois aumenta o tempo de viagem entre os terminais de carga e descarga.

No esquema da figura a seguir, vemos o resumo do conjunto de ações que foram tomadas para a criação desta nova família de projeto.

 

 

DOT 117 A

Para visualizar o resumo das modificações nos tanques DOT 117, por favor clique sobre a figura. Como está em alta resolução, poderá levar alguns segundos para abrir.